DIREITOS FUNDAMENTAIS

Os direitos fundamentais possuem caráter de "norma constitucional", São direitos com fundamento no Princípio da Soberania Popular, tais direitos tendem a obedecer os critérios de razoabilidade e proporcionalidade previstos na lei , suas caracteristicas são: historicidade, inalienabilidade, imprescritibilidade, irrenunciabilidade, inviolabilidade, universalidade, concorrência, efetividade, interdependência e complementaridade.

Os direitos fundamentais são invioláveis, enquanto não podem ser desrespeitados por qualquer autoridade ou lei infraconstitucional, sob pena de ilícito civil, penal ou administrativo

A efetividade dos direitos fundamentais é assegurada pelos meios coercitivos dos quais dispõe o Estado para garantir a possibilidade de exercício das prerrogativas constitucionais ora aventadas.

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quarta-feira, 30 de junho de 2010

A possibilidade de alteração do regime de bens do casamento no novo Código Civil e as consequências no mercado imobiliário

A possibilidade de alteração do regime de bens do casamento no novo Código Civil e as consequências no mercado imobiliário

Elaborado em 05.2010.

Fabrícia Cristina Estrella Figueiredo Pereira

Advogada especialilta em Direito de Família e das Sucessões, Professora de Direito Civil da Escola da Magistratura do Estado do RJ, da Universidade Estácio de Sá, do Curso MERITUM, da MERCURY EVENTOS, Consultora Jurídica, palestrante e autora jurídica

O regime dos bens do casal é o complexo de normas que disciplina as relações econômicas entre marido e mulher durante o casamento. [01]

Desde 1977 o regime legal do casamento é o da comunhão parcial de bens, considerando-se a alteração imposta pela Lei do Divórcio (Lei nº. 6.515/77).

Neste regime, diferentemente do anterior da comunhão universal de bens, comunicam-se os bens adquiridos após a união, com esforço comum (aquestos), excluindo-se da comunhão os bens particulares, ou seja, os anteriores ao casamento, além daqueles provenientes de doação ou de herança, ainda que tais atos de liberalidade ocorram durante a união.

A alteração da legislação em relação ao regime legal se deve ao fato da própria evolução da sociedade, onde, atualmente, observa-se maior participação da mulher na subsistência do grupo familiar, sendo, pois, razoável que se dividam os aquestos, frutos da união conjugal. Ressalte-se que o último resquício da submissão da mulher ao chefe de família desapareceu com o princípio da igualdade jurídica integral entre os cônjuges, consagrado no art. 226 da Constituição da República.

Cumpre observar que o Código Civil de 1916 não previa a alteração do regime de bens do casamento, tendo como regra sua imutabilidade. Contudo, face à alteração das relações familiares, observam-se novidades no Código Civil de 2002 e na jurisprudência pátria, no sentido da flexibilização das regras impostas às entidades familiares, até porque a Constituição da República de 1988 protegeu novas espécies de grupos familiares.

Entre as novas famílias da CR/88 encontram-se a família monoparental do art. 226, §4º, formada por um dos pais e de sua respectiva prole, e a união estável que foi alçada ao status de entidade familiar no art. 226, §3º.

Ademais, o afeto se tornou a base de toda e qualquer relação familiar no novo Código Civil que, por exemplo, garante no parágrafo único do art. 1584 a guarda dos filhos, em hipótese de dissolução da sociedade conjugal, à pessoa com maior afetividade em relação ao menor.

Essas alterações da nova legislação fizeram surgir questionamentos na seara do Direito Imobiliário, no que concerne às relações envolvendo contratantes casados.

O art. 1.639, §2º do CC/02 dispõe que "é admissível a alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros."

Portanto, como se trata de procedimento que exige a autorização judicial, não se pode alterar regime de bens com base na Lei nº. 11.441/07, que possibilitou a realização de inventário e partilha, separação e divórcio consensuais por via administrativa. Trata-se de ato judicial que depende de pedido assinado por ambos os cônjuges, cabendo ao juiz autorizá-lo ou negá-lo, em face das razões alegadas.

Se o juiz deferir o pedido de alteração do regime, determinará a expedição de mandado para a averbação da alteração junto ao Cartório do Registro Civil das Pessoas Naturais, onde se deu a celebração do casamento.

É mister salientar que parte da doutrina entende não ser possível a alteração do regime de bens dos casamentos realizados na vigência do Código Civil de 1916, face ao disposto no art. 2.039 do CC de 2002. Contudo, o Enunciado 260 da III Jornada de Direito Civil do STJ permite a alteração do regime de bens destes casamentos. Ademais, a jurisprudência pátria também se posiciona nesse sentido. [02]

No direito brasileiro vigora a regra da eficácia imediata da lei nova, respeitado o direito adquirido (art. 6º, da Lei de Introdução do Código Civil), segundo a formulação doutrinária de consideração dos fatos passados, pendentes e futuros (facta praeterita, pendentia, futura). A eficácia imediata da lei nova não alcança os fatos passados consumados, nem a parte já consumada dos fatos pendentes, em virtude da vedação de retroatividade máxima da norma. Alcança, pois, a parte posterior dos fatos pendentes e os fatos futuros. Nisso distingue-se a eficácia imediata (sobre o presente) do efeito retroativo (sobre o passad0). [03]

Portanto, mantém-se intocada a validade dos atos como foram constituídos segundo a lei antiga, e submete-se sua eficácia futura à lei nova, fórmula esta adotada pelo art. 2.035 do CC/02, também incidente sobre o casamento e respectivo regime de bens, por ser ato jurídico. [04]

Em relação à alteração de regime nos casamentos que adotaram a separação legal ou obrigatória de bens (art. 1.641, CC/02), o Enunciado 262 da III Jornada de Direito Civil do STJ afirma que tal alteração será possível, desde que superada a causa que impôs o regime, nas hipóteses dos incisos I e III do art. 1.641, do Código Civil. De acordo com esse entendimento, o STJ, no Resp 821.807-PR, 2006, julgou pedido de alteração do regime de separação obrigatória formulado por cônjuges que se casaram quando tinham 17 anos em 1998, tendo decidido por sua procedência, permanecendo os fatos e efeitos anteriores sob regência da lei antiga.

Atualmente, a liberdade de estruturação do regime de bens, para os nubentes, é total. Não impôs a lei a contenção da escolha apenas a um dos tipos previstos. Podem fundir tipos, com elementos ou partes de cada um; podem modificar ou repelir normas dispositivas de determinado tipo escolhido, restringindo ou ampliando seus efeitos; podem até criar outro regime não previsto na lei, desde que não constitua expropriação disfarçada de bens por um contra outro, ou ameaça a crédito de terceiro, ou fraude à lei, ou contrariedade aos bons costumes. Ressalte-se que as regras gerais aplicáveis a quaisquer regimes não podem ser derrogadas pelos nubentes. [05]

Ao contrário dos direitos brasileiro e francês, o direito alemão limita a liberdade dos nubentes à escolha dos tipos previstos na lei, sem poder modificá-los ou construir tipo novo. Segundo Schlüter, "vale o princípio da limitação dos tipos (numerus clausus dos tipos de regime de bens modelados na lei). Portanto, não pode ser acordado um regime de bens que não está previsto no Código Civil alemão, bem como não é permitido o surgimento de regime de bens mistos, nos quais elementos característicos dos diversos regimes de bens são misturados entre si." [06]

Contudo, apesar do princípio da liberdade de escolha e estruturação do regime de bens, não podem os nubentes submetê-lo à condição como, por exemplo, estabelecer no pacto antenupcial que o regime da separação vigorará, mas, sobrevindo filho, passará a ser o da comunhão universal. [07]

Problema maior reside no fato de se atingirem direitos de terceiros de boa-fé com a alteração do regime, hipótese, a princípio, levada em consideração para o indeferimento do pedido do casal, no art. 1.639, §2º, in fine, CC/02.

Cada entidade familiar possui infinitas relações de caráter econômico ao longo de sua existência. Por se tratarem de direitos patrimoniais, terceiros são os que estejam de boa-fé e possam ser atingidos em seus patrimônios ou créditos com a alteração do regime de bens.

Portanto, a mudança de regime de bens apenas valerá para o futuro, não prejudicando os atos jurídicos perfeitos. A mudança poderá alcançar os atos passados se o regime adotado, como por exemplo, a substituição da separação convencional pela comunhão parcial ou universal, beneficiar terceiro credor, pela ampliação das garantias patrimoniais. O que se proíbe é que a mudança de regime permita aos cônjuges agir fraudulentamente contra os interesses destes terceiros. [08]

Finalmente, não há prazo mínimo, após o casamento, para o requerimento da alteração do regime. O direito brasileiro difere do art. 1.397 do Código Civil francês que estabelece um prazo de dois anos após a celebração do matrimônio ou após a homologação da última mudança de regime.

A família é preservada pela Constituição da República, na forma prevista em seu artigo 226, tida como entidade núcleo da sociedade.

Nada impedirá que se permita a modificação do regime, para todos os casamentos. Note-se que o legislador, em outros momentos, como em relação à enfiteuse, revelou seu espírito de conservação de institutos, em confessada teleologia de preservação, não de extinção. Deixa, assim, para todos, entreaberta, a opção da modificação ou da preservação dos regimes havidos, quer em sentido estrito, quer em sentido lato. [09]

Notas

1. LEITE, Eduardo de Oliveira. Direito Civil Aplicado, Direito de Família, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2005, vol. 5, p. 295.
2. É possível alterar regime de bens de casamentos anteriores à vigência do Código Civil de 2002. (Apelação Cível 70006423891. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. 7ª Câmara Cível. Rel. Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves. Julgada em 13.08.2003) (Boletim da AASP nº 2.400 - Ementário, pág. 870). Civil. Regime matrimonial de bens. Alteração judicial. Casamento ocorrido sob a égide do CC/1916 (Lei nº 3.071). Possibilidade. Art. 2.039 do CC/2002 (Lei nº 10.406). Correntes doutrinárias. Art. 1.639, §2º, c/c art. 2.035do CC/2002. Norma geral de aplicação imediata. (Recurso Especial 730.546-MG. Superior Tribunal de Justiça. 4ª Turma. Rel. Min. Jorge Scartezzini. Julgado em 23.08.2005).
3. ROUBIER, Paul. Le droit transitoire: conflits dês lois dans Le temps, p. 177.
4. LÔBO, Paulo. Direito Civil, Famílias, São Paulo, Editora Saraiva, 2009, p. 316.
5. LÔBO, Paulo. Direito Civil, Famílias, São Paulo, Editora Saraiva, 2009, p. 295.
6. LÔBO, Paulo. Direito Civil, Famílias, São Paulo, Editora Saraiva, 2009, p. 296.
7. VELOSO, Zeno. Regimes Matrimoniais de Bens. Direito de Família Contemporâneo. Belo Horizonte, Editora Del Rey, 1997, p. 96.
8. LÔBO, Paulo. Direito Civil, Famílias, São Paulo, Editora Saraiva, 2009, p. 299.
9. AGHIARIAN, Hércules. Da Modificação do Regime de Bens

Serviços públicos essencias: interrupção ou continuidade?

Serviços públicos essencias: interrupção ou continuidade?

Elaborado em 06.2010.

Rodrigo Emiliano Ferreira

Defensor Público do Estado de São Paulo

1.Introdução

É princípio da Administração Pública a continuidade dos serviços públicos.

A par disso, o Código de Defesa do Consumidor, em dispositivo corajoso, mas que, desgraçadamente, não vem sendo aplicado a contento, consagra a continuidade dos serviços públicos essenciais, aos dispor, em seu artigo 22, que: "Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros, e, quanto aos essenciais, contínuos".

A aplicação do Código de Defesa do Consumidor, porém, encontra obstáculo, declarado pelo Poder Judiciário, na Lei 8.987, de 13 de fevereiro de 1995.

Diz o caput do artigo 6º da mencionada Lei 8.987/95 que: "Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários, conforme estabelecido nesta lei, nas normas pertinentes e no respectivo contrato".

A definição do que seja serviço adequado vem no parágrafo 1º do mesmo artigo, sendo tido como aquele que: "(...) satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas".

O parágrafo 3º, do mesmo artigo 6º, contudo, abre exceção à continuidade do serviço, ao estabelecer que: "Não se caracteriza como descontinuidade do serviço a sua interrupção em situação de emergência ou após prévio aviso, quando: (...) II - por inadimplemento do usuário, considerado o interesse da coletividade; (...)".

A título meramente ilustrativo, citamos o seguinte julgado, do Superior Tribunal de Justiça, cuja Jurisprudência amplamente dominante é pela possibilidade de suspensão dos serviços essenciais, em caso de inadimplemento do consumidor, dando aplicação ao artigo 6º da Lei 8.987/95, e afastando a incidência do CDC:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. ENERGIA ELÉTRICA. CORTE NO FORNECIMENTO. CONSUMIDOR INADIMPLENTE.

POSSIBILIDADE. ESSENCIALIDADE DO SERVIÇO. NÃO-CARACTERIZAÇÃO.

1. A Jurisprudência assente deste Tribunal entende pela possibilidade de corte no fornecimento de energia elétrica desde que, após aviso prévio, o consumidor permaneça em situação de inadimplência com relação ao respectivo débito, nos termos do estatuído no art. 6º, § 3º, da Lei 8.987/95. Precedentes: Recursos especiais n. 363.943/MG e 963.990/SC.

2. In casu, o Tribunal de origem entendeu que a mera inadimplência do consumidor não constituía motivação suficiente a ensejar o corte no fornecimento de energia elétrica por resultar em ofensa ao princípio da continuidade do serviço. Tal posicionamento contraria a jurisprudência do STJ, haja vista que não foi comprovada a essencialidade do serviço prestado, nem tampouco ficou evidenciado tratar-se de débito pretérito, hipóteses essas que impedem a suspensão do serviço.

3. Recurso especial parcialmente conhecido, e, nessa parte, provido.

(REsp 800.586/RS, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/09/2008, DJe 23/10/2008).

Ainda que a Jurisprudência nacional, de forma quase que pacífica, admita a suspensão de serviços públicos essenciais, como o fornecimento de energia elétrica ou abastecimento de água, em caso de inadimplemento do usuário, pessoa física, buscaremos aqui demonstrar que o Poder Judiciário, em especial o Tribunal de Justiça de São Paulo, tem aberto exceções a esta regra, e, em situações excepcionais, dando aplicação a princípios constitucionais como a dignidade da pessoa humana, tem determinando a continuidade da prestação do serviço ao consumidor, ainda que inadimplente.

2.Definição de Serviços Públicos Essenciais

Inicialmente, cumpre esclarecer que não há, nem na doutrina, nem na Jurisprudência, indicação precisa acerca de quais serviços públicos devem ser considerados essenciais.

Há doutrinadores que afirmam que todos os serviços públicos são essenciais, característica que decorreria de sua própria natureza de publicidade. Mas há outros que tomam como parâmetro para tal definição o rol de serviços indicados nos incisos do artigo 10 da Lei 7.783/89, que dispõe sobre o exercício do direito de greve, define as atividades essenciais, regula o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade, e dá outras providências.

Segundo o texto da Lei 7.783/89 são considerados serviços ou atividades essenciais o tratamento e abastecimento de água; a produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis; a assistência médica e hospitalar; a distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos; os serviços funerários; o serviço de transporte coletivo; a captação e tratamento de esgoto e lixo; o serviço de telecomunicações; a guarda, uso e controle de substâncias radioativas, equipamentos e materiais nucleares; o processamento de dados ligados a serviços essenciais; o controle de tráfego aéreo e a compensação bancária.

Para o presente estudo, que tem por objetivo a análise da possibilidade de suspensão dos serviços públicos essenciais, ganham relevância os serviços de abastecimento de água e coleta de esgoto, fornecimento de energia elétrica e serviço de telecomunicações, eis que estes, via de regra, têm sua exploração concedida a pessoas jurídicas de direito privado, sociedades empresárias, que não titubeiam em proceder sua interrupção em caso de inadimplência.

De início, a vida prática revela que, ainda que em caso de não pagamento, a coleta de esgoto não é interrompida, por impossibilidade técnica, pois não se vislumbra hipótese de que a rede de esgotos do consumidor seja desligada da rede de coleta. Via de regra os serviços de coleta de esgoto e de abastecimento de água são prestados pela mesma empresa, que se limita à interrupção deste último.

De outro lado, o serviço de telecomunicações, cuja suspensão, ao usuário pessoa física, normalmente se manifesta no desligamento da linha telefônica, não tem contornos de essencialidade. Tal se dá pela possibilidade de utilização de telefones públicos, ou mesmo de celulares pré-pagos, amplamente difundidos no país entre os consumidores.

Em se tratando de repartições públicas, pode-se argumentar que o serviço de telefonia, ou mesmo de conexão à internet seja essencial, notadamente em razão do interesse público aí presente, mas isso foge ao objeto desta reflexão.

Em breve comentário, en passant, diga-se que o Superior Tribunal de Justiça tem declarado, de forma recorrente, não ser lícita a suspensão de serviços essenciais a repartições públicas, ainda que em caso de inadimplência, quando tal possa atingir os interesses da coletividade. Vejamos os seguintes julgados:

SUSPENSÃO DE LIMINAR. ILUMINAÇÃO PÚBLICA. CORTE. A iluminação pública é indispensável à segurança dos cidadãos; a inadimplência do Município quanto ao pagamento do respectivo serviço não justifica o corte do fornecimento da energia elétrica necessária para esse efeito. Agravo regimental não provido.

(AgRg na SLS 1.048/CE, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, CORTE ESPECIAL, julgado em 07/10/2009, DJe 05/11/2009).

ADMINISTRATIVO – SUSPENSÃO DO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA DO MUNICÍPIO – FALTA DE PAGAMENTO.

1. É lícita a interrupção do fornecimento de energia elétrica se, após aviso prévio, o Município não quita sua dívida junto à concessionária de serviço público. Contudo, o corte não pode ocorrer de maneira indiscriminada, de forma a colocar em risco o interesse público.

2. Impossibilidade do corte para a sede da prefeitura, o posto de saúde e o cemitério público do Município.

3. Recurso especial não-provido.

(REsp 734.440/RN, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/08/2008, DJe 22/08/2008).

O mesmo não ocorre, contudo, como já exposto na introdução do presente estudo, quando o consumidor inadimplente é pessoa física, hipótese em que o STJ tem se manifestado pela possibilidade da suspensão do serviço.

Assentadas as duas primeiras premissas, quais sejam, a de que são serviços essenciais, sem prejuízo de que outros também o sejam, o abastecimento de água e o fornecimento de energia elétrica, e a de que a Jurisprudência pátria consolidou-se pela possibilidade de suspensão dos serviços públicos essenciais, em caso de inadimplemento do consumidor, passemos adiante.

3.Hipóteses Excepcionais de Manutenção do Serviço

Neste ponto há de se ressaltar que as concessionárias, em que pese, via de regra, sejam pessoas jurídicas de direito privado, que exercem sua atividade visando à obtenção de lucro, prestam serviço público, essencial. Verifica-se aí, de plano, um choque de valores. De um lado a busca do lucro pelas concessionárias, e, de outro, a essencialidade e necessidade do serviço, por parte dos consumidores, que, por vezes, não têm como arcar com a contraprestação.

Como dito, os serviços de fornecimento de energia elétrica e de abastecimento de água são essenciais, básicos. Não se pode conceber, atualmente, que imóvel residencial situado em centro urbano seja desprovido de água ou de energia elétrica. A falta de tais bens ofende direitos básicos de todo cidadão, consagrados pela Constituição da República:

"Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I – a soberania;

II – a cidadania;

III – a dignidade da pessoa humana;

(...)".

"Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

I – construir uma sociedade livre, justa e solidária;

(...)

III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação".

Como ressaltado, o Brasil é Estado Democrático de Direito, e o conceito de democracia, trazido pela Constituição da República, não se limita ao direito de votar e de ser votado, mas sim, e de não menos importância, consiste no direito ao exercício da dignidade de cada cidadão, que se evidencia, aqui, no acesso aos serviços estatais básicos.

Mesmo sendo de profunda importância a discussão, em abstrato, da possibilidade da suspensão de serviços públicos essenciais, é inegável que a Jurisprudência majoritária entende ser lícita a interrupção. Algumas situações, contudo, em respeito à dignidade da pessoa humana, e de outros princípios superiores, consagrados pela Constituição, como o direito à saúde e mesmo à vida, merecem especial consideração.

Como já dito, em havendo concessão da exploração de serviços públicos instaura-se, desde logo, um conflito de interesses. Da concessionária, que busca o lucro com a exploração, e do consumidor desses serviços, de regra, essenciais e monopolizados.

De fato, o Tribunal de Justiça de São Paulo, seguindo a mesma linha do Superior Tribunal de Justiça, vem se manifestado, na maioria dos julgados, pela possibilidade da suspensão do serviço em caso de não pagamento. O Tribunal de Justiça paulista, porém, atenta ao fato de que, em circunstâncias peculiares, o serviço não deve ser suspenso, ainda que disponibilizado ao consumidor inadimplente. Ressalta o Tribunal que, nestes casos, devem prevalecer princípios e valores mais elevados, tais como o interesse coletivo, a dignidade da pessoa humana, e mesmo o direito à vida, todos consagrados constitucionalmente. Vejamos:

Apelação Com Revisão 1046145009

Relator(a): Antonio Benedito Ribeiro Pinto

Comarca: F.D. GUARAREMA/MOGI DAS CRUZES

Órgão julgador: 25ª Câmara de Direito Privado

Data do julgamento: 27/11/2007

Data de registro: 27/12/2007

Ementa: ... terceiro, inciso II, da Lei n° 8.987/95) - O corte do fornecimento de serviços essenciais como forma de compelir o usuário ao pagamento de tarifa ou multa, extrapola os limites da legalidade e afronta a cláusula pétrea de respeito à dignidade humana - A fornecedora tem outros meios jurídicos e legais para efetuar a cobrança do débito - Nego provimento ao recurso. Mantenho a segurança

Ementa: PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS (energia elétrica) - MANDADO DE SEGURANÇA - Legitimidade passiva ad causam - ''Tribunal Regional Federal não é competente para julgar recurso de decisão proferida por juiz estadual não investido de jurisdição federal" (Súmula n° 55 do STJ) - A Lei de Concessões estabelece ser possível a descontinuidade do serviço público desde que não esteja presente o interesse da coletividade, como se vê no caso concreto, por se tratar entidade assistencial a idosos (artigo 6o, parágrafo terceiro, inciso II, da Lei n° 8.987/95) – O corte do fornecimento de serviços essenciais como forma de compelir o usuário ao pagamento de tarifa ou multa, extrapola os limites da legalidade e afronta a cláusula pétrea de respeito à dignidade humana - A fornecedora tem outros meios jurídicos e legais para efetuar a cobrança do débito - Nego provimento ao recurso. Mantenho a segurança como concedida. (grifo nosso)

Apelação Com Revisão 1032727007

Relator(a): Lino Machado

Comarca: São Paulo

Órgão julgador: 30ª Câmara de Direito Privado

Data do julgamento: 19/12/2007

Data de registro: 11/03/2008

Ementa: Prestação de serviços de fornecimento de energia elétrica - Inadimplemento - Corte Inexigibilidade. Embora seja exigível a dívida pelo consumo de energia elétrica e, em tese, seja possível a suspensão de seu fornecimento, tal sanção deixa de ser aplicada quando, no caso concreto, se constata a aplicabilidade de princípio mais elevado, como o respeito à dignidade do consumidor e de ...

Ementa: Prestação de serviços de fornecimento de energia elétrica - Inadimplemento - Corte Inexigibilidade. Embora seja exigível a dívida pelo consumo de energia elétrica e, em tese, seja possível a suspensão de seu fornecimento, tal sanção deixa de ser aplicada quando, no caso concreto, se constata a aplicabilidade de princípio mais elevado, como o respeito à dignidade do consumidor e de sua sobrevivência. Apelação provida em parte. (grifo nosso).

Em casos também excepcionais, em que o consumidor inadimplente tem severo abalo em sua saúde, de forma que, para ele, o serviço torna-se ainda mais essencial e mesmo vital, o Tribunal de Justiça paulista, dando efetividade aos princípios constitucionais acima mencionados, já decidiu pela manutenção do serviço. Citamos os seguintes julgados:

Apelação 991070172250 (7137556300)

Relator(a): Richard Paulro Pae Kim

Comarca: Pindamonhangaba

Órgão julgador: 21ª Câmara de Direito Privado D

Data do julgamento: 31/01/2008

Data de registro: 07/02/2008

Ementa: ENERGIA ELÉTRICA - POSSIBILIDADE DE CORTE NO CASO DE INADIMPLEMENTO DO USUÁRIO - Entretanto, na hipótese, o autor é aposentado por invalidez, sendo portador de leucemia meilóide crônica, teve prescrita medicação que exige manutenção em refrigeração, e mais, o estudo social revelou que o autor vive em precárias condições de moradia, possuindo equipamentos domésticos restritos ao mínimo ...

Ementa: ENERGIA ELÉTRICA - POSSIBILIDADE DE CORTE NO CASO DE INADIMPLEMENTO DO USUÁRIO - Entretanto, na hipótese, o autor é aposentado por invalidez, sendo portador de leucemia mielóide crônica, teve prescrita medicação que exige manutenção em refrigeração, e mais, o estudo social revelou que o autor vive em precárias condições de moradia, possuindo equipamentos domésticos restritos ao mínimo indispensável para atender as necessidades básicas do grupo familiar - Direito à vida que deve prevalecer sobre os demais dispositivos infraconstitucionais, na espécie - Nega- se provimento ao recurso. (grifo nosso).

Apelação 991070156906 (7136021100)

Relator(a): Paulo Sérgio Romero Vicente Rodrigues

Comarca: São Paulo

Órgão julgador: 20ª Câmara de Direito Privado D

Data do julgamento: 17/12/2007

Data de registro: 23/01/2008

Ementa: ... consumidor. Depois da passagem da água pelo hidrômetro, a responsabilidade não é mais da concessionária. Suspensão do fornecimento de água para consumidora pobre, deficiente visual, que mora sozinha, para compeli-la ao pagamento de cofitas de água. Impossibilidade. Aplicação do artigo 22 do CDC e dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana. Recursos não ...

Ementa: Vazamento de água no interior do imóvel. Consumo imputável ao consumidor. Depois da passagem da água pelo hidrômetro, a responsabilidade não é mais da concessionária. Suspensão do fornecimento de água para consumidora pobre, deficiente visual, que mora sozinha, para compeli-la aos pagamentos de contas de água. Impossibilidade. Aplicação do artigo 22 do CDC e dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana. Recursos não providos. (grifo nosso).

De todo conveniente, no momento, expor, com mais longevidade, a posição que vem sendo tomada pelo Tribunal de Justiça bandeirante. Citamos, aqui, trecho do voto do Desembargador Relator Richard Paulro Pae Kim, que foi fundamento para decisão da Apelação n° 7.137.556-3, originada da 3ª Vara Cível da Comarca de Pindamonhangaba, em que foi Apelante Bandeirante Energia S/A e Apelado Sebastião de Souza Duarte:

"A parte apelante apenas sustenta que o apelado não efetivou o pagamento das contas, razão pela qual teria o direito de efetuar o corte no fornecimento da energia elétrica. Contudo, olvidou-se de considerar acerca do fato de que, como bem salientou o nobre magistrado, "o autor é aposentado por invalidez (fls. 33), sendo portador de leucemia meilóide crônica (fls. 28), teve prescrita medicação que exige manutenção em refrigeração (fls. 29/32). E mais, o estudo social revelou que o autor vive em precárias condições de moradia, possuindo equipamentos domésticos restritos ao mínimo indispensável para atender as necessidades básicas do grupo familiar (fls. 104/108)" (cf. fls. 126).

Ou seja, o nobre magistrado não poderia do ponto de vista da deontologia jurídica, conferir razão ao apelante. Sem dúvida alguma, desprover a pretensão do apelado, já afirmada liminarmente, seria decretar a possível morte do paciente portador de espécie de câncer.

Revelam-se, portanto, interesses legítimos igualmente tuteláveis pelo ordenamento jurídico. Todavia, o direito à vida e o direito à vida com dignidade deve se sobrepor, pelo menos na presente espécie, ao interesse da concessionária em proceder à suspensão do fornecimento de energia ao domicílio do apelado.

Cuida-se de situação especial onde uma pessoa enferma necessita de aparelho elétrico para manter-se viva, sem depender de terceiros, consoante se vislumbra pelas provas trazidas aos autos.

É certo que não é um bom exemplo permitir a utilização de um serviço sem a devida contraprestação, todavia, no caso acima apresentado, está em jogo a vida humana, que se sobrepõe às demais situações, por se tratar de um direito fundamental. Portanto, seria inconcebível que uma vida fosse colocada em perigo, com o desligamento da força, pelo fato de não ter havido o pagamento das taxas de energia elétrica". (grifo nosso).

Outrossim, de teor bastante similar e seguindo o mesmo raciocínio, voto do Desembargador Relator Paulo Sérgio Romero Vicente Rodrigues, na Apelação n° 7.136.021-1, originária da Comarca de São Paulo, em que foi apelante a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo - SABESP e apelada e apelante adesiva Patrocínia dos Santos:

"O recurso da requerida também não comporta provimento, como já antecipado. A situação não é comum, mas diferenciada, devendo ser analisada à luz dos princípios do Estado de Direito e da Justiça. Há no feito duas teses: a da autora que quer pagar dentro de suas possibilidades, e a da requerida que quer cortar o fornecimento para compelir a autora a pagar.

Acatada a tese da requerida, como a dívida é alta e a autora pobre, a mesma não vai pagar de uma só vez. Vai ficar sem tomar banho, sem cozinhar, sem dar descarga no banheiro, enfim, corre o risco de morrer doente e sem higiene.

Isto ofende todos os princípios constitucionais, da vida, da dignidade, da saúde, etc. Há conflito entre dois valores, e o patrimonial da ré não pode prevalecer, porque a vida com dignidade está acima dele. Assim, na interpretação das leis transcritas pela requerida e do CDC, aplica-se a tese mais benéfica à consumidora, para proibir-se o corte, devendo a ré cobrar pelas vias judiciais". (grifo nosso).

Vê-se, portanto, que em hipóteses singulares a Jurisprudência, notadamente a do Tribunal de Justiça de São Paulo, caminha no sentido da prevalência dos direitos fundamentais do usuário, ainda que inadimplente, sobre o direito de propriedade das concessionárias de serviço públicos essenciais, vedando a interrupção destes.

4.Conclusão

Ante as peculiaridades de casos concretos, portanto, ainda que seja entendimento amplamente majoritário da Jurisprudência nacional ser possível a suspensão do fornecimento de serviços essenciais, tais como o fornecimento de energia elétrica e o abastecimento de água, em razão do não pagamento das faturas de consumo, haja vista a necessidade da salvaguarda de valores supremos como a dignidade da pessoa humana, a saúde e mesmo a vida, hão de ser abertas exceções ao entendimento dominante, garantindo-se que o consumidor inadimplente não tenha suspensos serviços públicos essenciais.

terça-feira, 29 de junho de 2010

União homoafetiva e adoção: alteração de um paradigma.

União homoafetiva e adoção: alteração de um paradigma.
Revisitando o tema

Elaborado em 05.2010.

Filipo Bruno Silva Amorim

Procurador Federal na Procuradoria-Regional Federal da 1ª Região como Coordenador de Matéria Administrativa. Graduado pela UFRN. Pós-graduado em Direito Constitucional pela UNISUL-IDP-LFG. Mestrando em Direito e Políticas Públicas pelo CEUB.

Há cerca de 10 (dez) anos, ainda nos bancos da faculdade de direito e tendo acabado de cursar a disciplina "Estatuto da Criança e do Adolescente", fui instado por meu professor a escrever sobre o tema em questão. Aceitando o desafio, escrevi breve artigo que acabou por ser publicado, cerca de um ano depois (em junho de 2001), na Revista Jurídica Consulex, no espaço denominado "Voz Universitária". O artigo foi intitulado, ingenuamente, diga-se de passagem: "Adoção por homossexuais: permissão ou proibição?"

Tendo como mote o questionamento acima, aduzimos no nosso primeiro ensaio, verbis:

"Tal indagação traz em seu âmago não somente uma carga jurídico-legal, mas também um conteúdo valorativo imenso que vai de encontro aos costumes enraizados e conservados em nossa cultura. Antes de adentrarmos no mérito deste questionamento, mister se faz lembrar que o Direito caminha paralelamente com a sociedade: o fato gerador da norma nada mais é do que um fato social de onde se deduz que, para se mudar um ordenamento jurídico em determinados aspectos, tem de haver, a priori, uma mudança nos valores sociais, efeito que não acontece da noite para o dia, sobretudo no que se volve ao ângulo de aceitação da pessoal homossexual, tendo em vista o nosso meio sociocultural paternalista e preponderantemente machista." [01]

Nesta nova incursão, 10 (dez) anos depois, pretendemos, também de forma breve, revisitar o problema proposto e investigar as mudanças legislativas acerca do tema, bem como verificar a posição mais recente da nossa jurisprudência sobre a matéria.

Com efeito, quando, há 10 (dez) anos, nos propusemos a escrever sobre o tema, ainda vigia o Código Civil de 1916 e foi sobre ele, lido em conjunto com a Lei nº 8.069 de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA) e com a Constituição Federal, que nos debruçamos à época.

De início, pode-se afirmar que não houve mudanças legislativas relevantes sobre a temática investigada. Na verdade, não há nada específico em nossa legislação sobre a viabilidade ou não de um cidadão ou uma cidadã homossexual vir a adotar uma criança ou adolescente. Contudo, da leitura das normas existentes sobre a matéria "adoção" nos é apontado um norte a seguir.

Em 1916 o nosso legislador civil asseverou em seu artigo 370 que "Ninguém pode ser adotado por duas pessoas, salvo se forem marido e mulher." (grifo nosso)

Percebe-se claramente, pela leitura desse dispositivo, que a adoção, como, aliás, não poderia deixar de ser, está umbilicalmente ligada ao conceito de família; e a família vista sob a ótica do legislador do início do século passado era uma entidade formada pelo homem – marido, pela mulher - esposa e pelos filhos que adviessem dessa união. De modo a se afastar quaisquer dúvidas sobre a última afirmação, suficiente é a leitura de três dispositivos do Código Civil de 1916, abaixo transcritos:

Art. 229. Criando a família legítima, o casamento legitima os filhos comuns, antes dele nascidos ou concebidos (arts. 352 a 354).

Art. 233. O marido é o chefe da sociedade conjugal, função que exerce com a colaboração da mulher, no interesse comum do casal e dos filhos (arts. 240, 247 e 251).

Art. 240. A mulher, com o casamento, assume a condição de companheira, consorte e colaboradora do marido nos encargos de família, cumprindo-lhe velar pela direção material e moral desta.

O artigo 229 afirma que o casamento cria a família legítima. Como só podem casar pessoas de sexos diferentes, a família legítima para o legislador de 1916 era necessariamente formada pelo marido (v. art. 233) e pela mulher (v. art. 240).

Por sua vez, nossa Constituição asseverou no artigo 226 §§ 3º e 4º que a família, base da sociedade e merecedora de especial proteção do Estado, é formada pelo casamento ou pela união estável entre o homem e a mulher. Até aqui houve uma evolução (ou, caso prefiram, uma quebra de paradigma, como diria Khun) [02], pois deixou de haver a vetusta distinção entre família "legítima" e "ilegítima"; entretanto o padrão homem e mulher restou mantido. Todavia, outra alteração foi introduzida em nosso ordenamento, a família mono ou uniparental, ou seja, aquela formada por qualquer dos pais e seus descendentes. Ou seja, além da família, digamos "tradicional", formada pelo marido, pela esposa e, caso existente(s), pelo(s) filho(s), passou a existir juridicamente, significa dizer: tutelada e protegida pelo Estado, a família formada pelo pai ou pela mãe e seu(s) filho(s).

O atual Código Civil, Lei nº 10.406 de 2002 praticamente repetiu a norma do artigo 370 do antigo Código Material em seu artigo 1.622, apenas albergando a união estável, prevista constitucionalmente, a qual não restara tutelada pela codificação anterior. Assim dispõe o artigo 1.622: "Ninguém pode ser adotado por duas pessoas, salvo se forem marido e mulher, ou se viverem em união estável." (grifo nosso)

Passados 86 (oitenta e seis) anos entre um Código e o outro, ainda assim manteve-se a regra de que para que duas pessoas possam adotar devem ser casadas ou viverem em união estável. Embora se haja evoluído muito no tocante ao que se denominavam famílias "ilegítimas", extrai-se clara a dicção de que pessoas do mesmo sexo não poderão adotar conjuntamente.

É de se frisar, contudo, que o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, ainda na vigência do Código de 1916, previu a possibilidade da adoção singular, quando em seu artigo 42 asseverou que "Podem adotar os maiores de vinte e um anos, independentemente de estado civil". (grifo nosso).

Foi basicamente este dispositivo, há 10 (dez) anos atrás, que nos conduziu à conclusão acerca da possibilidade, ante a inexistência de vedação expressa, de que qualquer pessoa solteira (independentemente do sexo ou da orientação sexual) poderia vir a adotar [03]. Ressalte-se, por óbvio, que se houvesse vedação expressa no referido artigo 42 do ECA, ou em qualquer outro dispositivo de lei, ressalvando a hipótese de adoção em razão da orientação sexual do adotante, tal norma seria flagrantemente inconstitucional por ofensa direta ao artigo 1º, III, artigo 3º, IV e artigo 5º, caput [04].

Nessa esteira, o atual Código Civil parece caminhar na mesma trilha do ECA, já que em seu artigo 1.618 também permite a adoção singular, senão vejamos: "Só a pessoa maior de dezoito anos pode adotar." (grifo nosso)

Observe-se que o dispositivo está versado no singular – "pessoa" –, portanto, uma única pessoa pode candidatar-se a um processo de adoção. Robustece ainda mais essa conclusão, a dicção do parágrafo único do mesmo dispositivo legal, ao dispor que "A adoção por ambos os cônjuges ou companheiros poderá ser formalizada, desde que um deles tenha completado dezoito anos de idade, comprovada a estabilidade da família".

Ora, qual a razão para se tratar da adoção conjunta (pelo casal) no parágrafo único se não fosse para informar que o caput do artigo se reporta (ou de igual modo abarca) à adoção perfectibilizada por apenas uma pessoa, homem ou mulher? Entendemos que nenhuma. É regra comezinha de hermenêutica que a lei não possui palavras inúteis, deste modo, para se dar significado à existência do parágrafo único do artigo 1.618 forçosa é a conclusão de que a cabeça do dispositivo também alcança a adoção tida por singular, ou seja, por uma única pessoa.

A única diferença, pois, nos dispositivos em questão (art. 1.618 do CC e art. 42 do ECA) é a idade mínima do adotante: neste é de 21 (vinte e um), naquele 18 (dezoito) anos. Sobre essa peculiaridade, Regina Beatriz Tavares da Silva [05] esclarece:

"A emenda senatorial havia reduzido a idade do adotante de trinta anos, prevista no texto original, para vinte e cinco anos, bem como abolido a exigência de cinco anos de casamento para os adotantes casados. No entanto, este dispositivo ainda não estava compatibilizado com a legislação superveniente (Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei n. 8.069/90). Observe-se que o caput do art. 42 do Estatuto da Criança e do Adolescente já permitia a adoção a partir dos vinte e um anos, mas, tendo o novo Código Civil instituído a capacidade civil plena aos dezoito anos, no art. 5º, era necessário estabelecer o mesmo limite de idade com referência todos os atos da vida civil, incluindo a adoção."

Outro ponto do primeiro artigo que reputo merecer menção é a passagem em que questionei: "Poder-se-ia ainda perguntar se o fato de ser proibida a adoção de uma criança por um casal de homossexuais ofenderia o disposto no art. 3º, IV, bem como o caput do art. 5º e seu inciso XLI, todos da Constituição Federal (...)" [06]. A esse questionamento demos resposta negativa, não haveria ofensa aos referidos dispositivos. Ainda mantemos essa posição.

Explico: Primeiramente, devemos sublinhar que essa resposta em nada contradita a conclusão acima externada quanto à inconstitucionalidade de dispositivo infraconstitucional que vedasse a adoção em razão da orientação sexual do adotante. Lembre-se que ao tratarmos daquele ponto estávamos a nos referir ao contexto do artigo 42 do ECA e, atualmente, ao mesmo contexto do caput do artigo 1.618 do Código Civil, qual seja, a adoção singular, por uma única pessoa. Nesse sentido, se o texto legal prevê essa possibilidade para um heterossexual, deve prevê-la, de igual modo, a um homossexual.

O caso ora discutido é outro. Estamos a falar da adoção por um casal com orientação homoafetiva. Então, qual a diferença ontológica das situações? É que a tônica da nossa legislação não é vedar a adoção por casais homossexuais, mesmo porque tal união, embora exista no mundo fatos, não existe enquanto instituto consagrado por nossa legislação. Com efeito, a tônica da nossa legislação quando trata da adoção, ao nosso sentir, é a de permiti-la por uma entidade familiar ou para formar uma entidade familiar. Como antes demonstrado, entidade familiar é a formada ou pelo casamento entre homem e mulher (e seus filhos, se houver), pela união estável entre homem e mulher (e seus filhos, se houver), ou por quaisquer dos pais (homem ou mulher singularmente enxergados) e seus filhos.

Destarte, vê-se que todas as entidades familiares, a priori, estão aptas a adotar, bem como um homem ou uma mulher (singularmente, independentemente do seu estado civil) também. Em todos esses casos, ou participam do processo de adoção entidades familiares já constituídas, ou um único homem ou uma única mulher que, a partir da adoção, constituirá com seu descendente (criança ou adolescente adotado) uma nova entidade familiar, nos termos do artigo 226, § 4º da Constituição.

Assim, conclui-se, como se fez há uma década, que a vedação existente no nosso ordenamento (vedação esta que ainda persiste) é quanto à adoção conjunta por pessoas do mesmo sexo, independentemente da sua orientação sexual. Quer dizer que, do mesmo modo que um casal homossexual masculino ou feminino não pode conjuntamente adotar a mesma criança, dois irmãos ou amigos, ou duas irmãs ou amigas também não podem fazê-lo, sejam heterossexuais ou não, deste modo, independentemente da sua orientação sexual.

Tais conclusões, ao que parece, foram adotadas recentemente pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça ao julgar o Recurso Especial 889.852/RS, da relatoria do Ministro Luis Felipe Salomão [07], in litteris:

"Cuida-se da possibilidade de pessoa que mantém união homoafetiva adotar duas crianças (irmãos biológicos) já perfilhadas por sua companheira. É certo que o art. 1º da Lei n. 12.010/2009 e o art. 43 do ECA deixam claro que todas as crianças e adolescentes têm a garantia do direito à convivência familiar e que a adoção fundada em motivos legítimos pode ser deferida somente quando presentes reais vantagens a eles. Anote-se, então, ser imprescindível, na adoção, a prevalência dos interesses dos menores sobre quaisquer outros, até porque se discute o próprio direito de filiação, com consequências que se estendem por toda a vida. Decorre daí que, também no campo da adoção na união homoafetiva, a qual, como realidade fenomênica, o Judiciário não pode desprezar, há que se verificar qual a melhor solução a privilegiar a proteção aos direitos da criança. Frise-se inexistir aqui expressa previsão legal a permitir também a inclusão, como adotante, do nome da companheira de igual sexo nos registros de nascimento das crianças, o que já é aceito em vários países, tais como a Inglaterra, País de Gales, Países Baixos, e em algumas províncias da Espanha, lacuna que não se mostra como óbice à proteção proporcionada pelo Estado aos direitos dos infantes. Contudo, estudos científicos de respeitadas instituições (a Academia Americana de Pediatria e as universidades de Virgínia e Valência) apontam não haver qualquer inconveniente na adoção por companheiros em união homoafetiva, pois o que realmente importa é a qualidade do vínculo e do afeto presente no meio familiar que ligam as crianças a seus cuidadores. Na específica hipótese, há consistente relatório social lavrado por assistente social favorável à adoção e conclusivo da estabilidade da família, pois é incontroverso existirem fortes vínculos afetivos entre a requerente e as crianças. Assim, impõe-se deferir a adoção lastreada nos estudos científicos que afastam a possibilidade de prejuízo de qualquer natureza às crianças, visto que criadas com amor, quanto mais se verificado cuidar de situação fática consolidada, de dupla maternidade desde os nascimentos, e se ambas as companheiras são responsáveis pela criação e educação dos menores, a elas competindo, solidariamente, a responsabilidade. Mediante o deferimento da adoção, ficam consolidados os direitos relativos a alimentos, sucessão, convívio com a requerente em caso de separação ou falecimento da companheira e a inclusão dos menores em convênios de saúde, no ensino básico e superior, em razão da qualificação da requerente, professora universitária. Frise-se, por último, que, segundo estatística do CNJ, ao consultar-se o Cadastro Nacional de Adoção, poucos são os casos de perfiliação de dois irmãos biológicos, pois há preferência por adotar apenas uma criança. Assim, por qualquer ângulo que se analise a questão, chega-se à conclusão de que, na hipótese, a adoção proporciona mais do que vantagens aos menores (art. 43 do ECA) e seu indeferimento resultaria verdadeiro prejuízo a eles." (grifos nossos)

Percebe-se que o julgado do STJ, como não poderia deixar de ser, trilha o caminho da busca do interesse dos menores que serão adotados, nos termos do art. 43 do ECA, alicerçado também em estudos de renomadas instituições que concluem pela inexistência de qualquer inconveniente na adoção por companheiros em união homoafetiva, pois o que realmente importa é a qualidade do vínculo e do afeto presente no meio familiar que ligam as crianças a seus pais (adotantes).

De igual modo, é de se destacar que a decisão também registra que não há na nossa legislação a possibilidade de constar no registro de nascimento dos adotados a inclusão, como adotantes, do nome de pessoas de igual sexo. Isto tão somente corrobora a tese de que a impossibilidade de adoção conjunta por pessoas do mesmo sexo não se dá em razão de discriminação em face da sua possível opção sexual, como já havíamos sustentado no primeiro artigo [08] e voltamos a fazê-lo no presente estudo.

Não obstante a legislação não ter sido alterada de modo substancial nesses últimos 10 (dez) anos, o fato é que temos uma evolução de entendimento (quebra de paradigma [09]) marcante por parte do judiciário, que ao decidir demandas na verdade cria normas individuais para os casos concretos [10]: partimos de nenhuma decisão a favor e algumas decisões contra a possibilidade de um cidadão ou cidadã assumidamente homossexual adotar uma criança, para a existência de uma decisão, oriunda de uma Corte Superior, albergando dita possibilidade.

Neste sentido, cremos ainda ser atual a conclusão esposada no nosso primeiro artigo [11], razão pela qual a reproduziremos abaixo:

"Destarte a interpretação dos dispositivos legais, de forma a fazer com que os mesmos reflitam os anseios sociais predominantes, não pode ser taxada como sendo uma forma de burlar o ordenamento. Alguns podem até dizer que a lei não tem vida, e que não passava de letra fria... Entendemos que a lei pode realmente ser fria e morta se observada apenas como fruto de um trabalho puramente burocrático-legislativo. No entanto, cabe a nós, atuais e futuros operadores do Direito, darmos calor e vida à lei. E como fazê-lo? De uma forma bastante simples: interpretando-a de modo que a mesma reflita a imagem da sociedade para a qual foi elaborada, e, destarte, tornando-a verdadeira fonte de direito, como aprendemos nas nossas lições introdutórias ao ingressarmos na Universidade.

Quanto à nossa opinião, e totalmente coerente com o que aqui foi exposto, somos, sim, favoráveis a que homossexuais possam adotar, desde que separadamente, isto é, no nome de apenas um deles, embora vivendo juntos, pois não é a opção sexual do indivíduo que vai determinar o seu caráter ou a capacidade que tem de prover, criar e educar uma criança.

Com o que não concordamos, talvez, por influências simplesmente culturais, é que duas pessoas do mesmo sexo adotem a mesma criança ou adolescente, vez que a existência de um registro em que conste o nome de duas mulheres ou de dois homens como pais de uma determinada pessoa se opõe radicalmente (pelo menos ainda...) ao nosso ‘ordenamento consuetudinário.’"

Fazendo uma pequena alteração na conclusão anterior, diríamos hoje que somos simpáticos à possibilidade de pessoas do mesmo sexo, independentemente da sua orientação sexual, virem a adotar conjuntamente uma criança ou adolescente. Tal qual afirmado na decisão do Superior Tribunal de Justiça, o que se deve ter em mente é o bem estar do adotando e as reais vantagens do processo de adoção para essa criança ou adolescente.

Todavia, para isso ocorrer, cremos ser necessária uma alteração legislativa específica de modo a que tal possibilidade possa efetivamente ser abraçada pelo nosso ordenamento. Além disso, registre-se, haveríamos de elastecer o conceito de unidade familiar para os fins da adoção, caso contrário ter-se-ia uma dificuldade de adequação constitucional na situação pretendida.

Com efeito, o tempo é que vai ditar o caminhar da nossa sociedade: ontem só havia discursos; hoje há um forte precedente judicial e uma maior aceitação social da situação; amanhã, quem sabe, já não serão mais necessárias doutrina ou jurisprudência sobre o tema, as quais passarão a ser citadas tão somente como passagens históricas, caminhos outrora trilhados, necessários a mudanças sociais – alteração de paradigmas.

Notas

1. AMORIM, Filipo Bruno Silva. Adoção por homossexuais: permissão ou proibição? In: Revista Consulex – Voz Universitária – Ano V – Nº 107, de 30 de junho de 2001, p. 64.
2. Reputo relevante transcrevermos algumas breves passagens da obra "A estrutura das revoluções científicas" somente para pontuar qual a importância do paradigma para a ciência. Friso, contudo, que Khun ao tratar do tema, reportava-se ao que chamava de ciência normal, em oposição à ciência social, digamos assim:

"Qual é então a natureza dessa pesquisa mais especializada e esotérica permitida pela aceitação de um paradigma único por parte de um grupo? Se o paradigma representa um trabalho que foi completado de uma vez por todas, que outros problemas deixa para serem resolvidos pelo grupo por ele unificado? (...) No seu uso estabelecido, um paradigma é um modelo ou padrão aceitos.(...) Por outro lado, na ciência, um paradigma raramente é suscetível de reprodução. Tal como uma decisão judicial aceita no direito costumeiro, o paradigma é um objeto a ser melhor articulado e precisado em condições novas ou mais rigorosas." (p. 43-44).

"Os paradigmas adquirem seu status porque são mais bem sucedidos que seus competidores na resolução de alguns problemas que o grupo de cientistas reconhece como graves. (...) De início o sucesso de um paradigma (...) é, em grande parte, uma promessa de sucesso que pode ser descoberta em exemplos selecionados e ainda incompletos. A ciência normal consiste na atualização dessa promessa, atualização que se obtém ampliando-se o conhecimento daqueles fatos que o paradigma apresenta como particularmente relevantes, aumentando-se a correlação entre esses fatos e as predições do paradigma e articulando-se ainda mais o próprio paradigma." (p. 44) KUHN, Thomas S. A estrutura das revoluções científicas. São Paulo: Perspectiva, 1975, Tradução: Beatriz Vianna Boeria e Nelson Boeria.
3. Assim desenvolvemos o nosso raciocínio: "Infere-se deste dispositivo [referimo-nos ao art. 42 do ECA] que uma pessoa solteira pode adotar, independentemente de sua opção sexual. Então, um homossexual, independentemente de conviver ou não com um parceiro, poderia adotar. O que nossa legislação veda é que ambos (casal homossexual, instituto desconhecido pelo nosso ordenamento jurídico) adotem, em comum, uma pessoa." Op. Cit. p. 65.
4. Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...) III – a dignidade da pessoal humana.

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: (...) IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade, e quaisquer outras formas de discriminação.

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
5. SILVA, Regina Beatriz Tavares da. Novo Código Civil comentado. Coordenador Ricardo Fiuza. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 1430.
6. Op. Cit. p. 65.
7. O teor do julgado foi extraído do STJ nº 432. Referida decisão foi prolatada e à unanimidade acatada pela Turma, na sessão de 27 de abril de 2010, encontrando-se pendente de publicação.
8. "Poder-se-ia ainda perguntar se o fato de ser proibida a adoção de uma criança por um casal de homossexuais ofenderia o disposto no art. 3º, IV, bem como o caput do art. 5º e seu inciso XLI, todos da Constituição Federal (...). Entendemos que não. Os dispositivos constitucionais, ora examinados, garantem a todos os brasileiros e estrangeiros aqui residentes direitos iguais perante a lei, expurgando o nosso ordenamento, e punindo, segundo lei, qualquer forma de discriminação inclusive a discriminação sofrida pela escolha sexual. Cremos que a proibição, contida em lei, de pessoas do mesmo sexo adotarem, em comum, uma criança, se dá não pelo fato de serem ou não, homossexuais, mas sim, e exclusivamente, por serem do mesmo sexo. Da mesma forma que homossexuais não podem adotar conjuntamente uma criança, a dois amigos ou a duas amigas também não se o consente mesmo sendo heterossexuais. De maneira que a restrição não indica discriminação pela opção sexual do adotante, tanto é que um homossexual, interpretando-se sistematicamente a legislação vigente, pode adotar uma criança (art. 42 do ECA c/c arts. 3º, IV e 5º, XLI da CF/88). A vedação se dá quando duas pessoas do mesmo sexo intentam adotar a mesma criança." Op. Cit. p. 65.
9. Ver nota 2.
10. Segundo Kelsen, todo ato jurídico é simultaneamente aplicação de uma norma superior e produção/criação, regulada por esta mesma norma, de uma norma inferior. Se se considerar uma ordem jurídica Estadual, então a norma fundamental determina a criação da Constituição; que por sua vez é aplicação da norma fundamental. Por aplicação da Constituição tem-se a criação das normas jurídicas gerais (legislação e costume). E a aplicação dessas normas gerais, cria normas individuais através das decisões judiciais e das resoluções administrativas. A aplicação do direito é, por conseguinte, criação de uma norma inferior com base numa norma superior. KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 2006. Tradução de João Baptista Machado, p. 261.
11. Op. Cit. p. 65.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Cancelamento de show gera indenização

Cancelamento de show gera indenização
23/06/2010 - 10:24 | Fonte: TJMG

Um promotor de eventos de Divinópolis, centro-oeste de Minas, vai ser indenizado pelo Serviço Social da Indústria (Sesi) e Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) em R$ 18.323 por danos materiais, mais R$ 15 mil por danos morais. Através de contrato, as instituições haviam cedido espaço para a realização de um show que, entretanto, foi cancelado pelo Corpo de Bombeiros dois dias antes de sua realização por falta de condições de segurança do local.

De acordo com o processo, o promotor de eventos contratou com o Sesi, em 16 de julho de 2007, através de sua unidade operacional denominada “Sesi – CAT Jovelino Rabelo, coligado ao Sistema Fiemg”, a cessão de um ginásio de esportes para a realização do “IV Encontro de Pagode do Centro-Oeste Mineiro”, que seria realizado de 21 a 23 daquele mês.

No dia 19 de julho de 2007, contudo, o profissional foi notificado pelo Corpo de Bombeiros de que o evento não poderia ser realizado, diante de irregularidades encontradas no ginásio de esportes quanto à segurança contra incêndio e pânico. Ele tomou conhecimento de que o Sesi já havia sido notificado pelo Corpo de Bombeiros, no dia 9 de julho de 2007, após vistoria realizada, de que havia várias irregularidades na edificação e inclusive foi fixado um prazo de 60 dias para que as mesmas fossem sanadas.

O promotor de eventos ajuizou ação de indenização contra o Sesi, alegando que sofreu “prejuízos de toda ordem, tanto no sentido material como no sentido moral”. Além da contratação de diversas bandas de pagode, inclusive do grupo Swing e Simpatia, do Rio de Janeiro, para realização de shows, ele alega ter contratado projetos de segurança com profissional competente e de prestação de serviços para ampla divulgação do show, entre outros. Os danos morais, por sua vez, estariam configurados pelo fato de ter sua reputação profissional abalada, já que foi ameaçado e chamado de “ladrão” e “mentiroso”, pois já havia vendido vários lotes de ingressos, cujo valor alega ter devolvido.

O juiz Ather Aguiar, da 3ª Vara Cível de Divinópolis, condenou o Sesi e a Fiemg a indenizar o profissional em R$ 18.323, diante da comprovação dos prejuízos materiais e fixou o valor da indenização por danos morais em R$ 30 mil.

As duas instituições recorreram ao Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJMG), com a alegação de que não é de responsabilidade do locador do espaço a obtenção das autorizações, licenças ou alvarás necessários para a realização das atividades pretendidas pelo promotor de eventos. As instituições destacaram que, no próprio depoimento pessoal do profissional no processo, ele declarou que era responsável pela obtenção de licenças, inclusive do Corpo de Bombeiros.

O relator do recurso, desembargador Tiago Pinto, observou que “o indeferimento da autorização ocorreu devido a irregularidades do próprio espaço cedido, relativas à segurança do local, como o não funcionamento da bomba de recalque, mangueiras furadas, ausência de corrimãos de ambos os lados da escada de acesso, dentre outros”.

“Dessa forma”, continuou, “o que se verifica pela mencionada notificação é que o local cedido pelas instituições apresentou irregularidades que restringiriam a realização de qualquer evento e não apenas aquele específico contratado pelo promotor de eventos”.

O relator ressaltou ainda que a notificação do Corpo de Bombeiros foi recebida pelo Sesi em 9 de julho, anteriormente, portanto, à própria assinatura do contrato, em 16 de julho. “O contratante tomou conhecimento das irregularidades apresentadas no seu imóvel e, ainda assim, cedeu o espaço para a realização do show promovido pelo profissional de eventos, sem lhe informar do ocorrido ou lhe fazer qualquer ressalva no momento da assinatura”, destacou.

Considerando que os “enormes” prejuízos financeiros foram devidamente comprovados pelo promotor de eventos, o desembargador confirmou a indenização de R$ 18.323. Quanto à indenização por danos morais, entretanto, o relator decidiu reduzir seu valor para R$ 15 mil, “suficiente para amenizar os danos sofridos e inibir que novas lesões sejam praticadas com base em fatos semelhantes”.

Os desembargadores Antônio Bispo e Maurílio Gabriel acompanharam o voto do relator.

Processo: 1.0223.07.233428-5/001

Após ter justa causa desconstituída em juízo, trabalhador receberá multa do artigo 477 da CLT

Após ter justa causa desconstituída em juízo, trabalhador receberá multa do artigo 477 da CLT
23/06/2010 - 07:50 | Fonte: TST

Um trabalhador cuja dispensa por justa causa foi desconstituída pelo Tribunal Regional da 17ª Região (ES), consegue o direito de receber verbas rescisórias e a multa do artigo 477, § 8.º da CLT. Este é o resultado do julgamento na Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, que, ao negar provimento a recurso da empresa, manteve a decisão do TRT.

O caso iniciou-se quando a direção da Paranasa Engenharia o demitiu por justa causa, sob a alegação de que ele havia se desentendido com outro colega de trabalho, gerando ofensas verbais entre si. Ao analisar o caso, o juiz de primeiro grau (Vara do Trabalho) reconheceu a existência da justa causa, conforme dispõe o artigo 482, J, da CLT, segundo o qual pode ser demitido o empregado que, no serviço, comete contra qualquer pessoa ato lesivo da honra ou da boa fama.

Com isso, o ex-empregado recorreu ao TRT da 17ª Região (ES), que reformou a sentença e excluiu a justa causa. Para o Tribunal Regional, as alegações da empresa sobre os motivos da dispensa foram genéricos, ressaltando que meros desentendimentos verbais não são suficientes para ensejar a dispensa por justa causa. Com esses fundamentos, o TRT reverteu o ato em dispensa sem justa causa, condenando a empresa ao pagamento das parcelas rescisórias devidas e da multa do artigo 477, §8.º, da CLT.

Diante dessa decisão, a Paranasa Engenharia interpôs recurso de revista ao TST, alegando que as parcelas devidas da dispensa foram quitadas no prazo da lei e que a matéria debatida seria controvertida, uma vez que a justa causa foi afastada no segundo grau de jurisdição. Ao analisar o caso, o relator do processo, ministro Lelio Bentes Corrêa, concordou com a decisão do TRT, destacando que houve uma mudança da jurisprudência. Antes, se propunha o não cabimento da multa artigo 477 quando houvesse fundada controvérsia no fato gerador da obrigação (OJ nº 351 da SDBI-I). Agora, segundo o ministro, com o cancelamento dessa OJ, a existência ou não de controvérsia acerca da relação empregatícia – no caso a existência de justa causa – é irrelevante para se resolver a questão. Além disso, acrescentou Lelio Bentes, a alegação de justa causa, não confirmada em juízo, não isenta o empregador do pagamento da multa do artigo 477. O ministro ressaltou que o empregador, no uso do poder potestativo, ao realizar a dispensa argumentando justa causa, assume os riscos da reversão de suas alegações, sobretudo quanto à incidência da multa pela não quitação tempestiva do contrato de emprego (artigo 477, §8.º da CLT), como ocorreu no segundo grau.

Com esses fundamentos, a Primeira Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso de revista da empresa e manteve a decisão do TRT, que reverteu a justa causa e condenou a Paranasa ao pagamento de verbas rescisórias e da multa do artigo 477. Não houve interposição de novo recurso e o processo retornou ao TRT de origem. (RR-94800-75.2001.5.17.0005)

Alexandre Caxito

UNIÃO ESTÁVEL COM SEXAGENÁRIO, SEGUE O MESMO REGIME DO CASAMENTO

Mulher que viveu união estável com sexagenário só tem direito aos bens obtidos com trabalho do casal


Mulher que viveu união estável com sexagenário só tem direito aos bens obtidos com trabalho do casal
23/06/2010 - 08:52 | Fonte: STJ

À semelhança do que ocorre com o casamento, na união estável é obrigatório o regime de separação de bens, no caso de companheiro com idade igual ou superior a sessenta anos. Os ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) tiveram esse entendimento durante julgamento de um recurso que envolve o inventário de um falecido que viveu em união estável por oito anos. A mulher queria ter direito à metade dos bens deixados por ele.

A convivência do casal começou quando o homem tinha 64 anos. O casal viveu em união estável de agosto de 1993 a setembro de 2001, quando ele morreu. A companheira questionou a decisão da 3ª Vara de Família e Sucessões da Comarca de Porto Alegre (RS) que concedeu apenas a partilha dos bens adquiridos durante a união estável, com a comprovação do esforço comum. O juiz entendeu que o regime adequado ao caso é o da separação obrigatória de bens, já que o companheiro iniciou o relacionamento após os 60 anos de idade.

Entretanto, para o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, a obrigatoriedade de se adotar o regime de separação de bens aplica-se unicamente ao casamento.

No STJ, o relator, ministro Luis Felipe Salomão, discordou desse posicionamento. Segundo o ministro, permitir que um casal opte pelo regime de bens quando o homem já atingiu a idade sexagenária seria o mesmo que prestigiar a união estável em detrimento do casamento. Para os companheiros maiores de 60 anos, devem ser aplicadas as mesmas limitações previstas para o casamento, ou seja, deve prevalecer o regime de separação de bens. Salomão votou pelo restabelecimento da decisão de primeiro grau: “A companheira fará jus à meação dos bens adquiridos durante a união estável, desde que comprovado, em ação própria, o esforço comum”.

O desembargador convocado Honildo de Mello Castro havia pedido vista. Ele acompanhou o relator, mas divergiu da necessidade de demonstrar a formação do patrimônio por esforço do casal. Contudo, os demais ministros da Quarta Turma votaram com o relator.

MUDANÇA DE SEXO - APOSENTADORIA

Homem que mudou de sexo aos 58 se aposentará como mulheres, aos 60


Homem que mudou de sexo aos 58 se aposentará como mulheres, aos 60
23/06/2010 - 07:11 | Fonte: BBC Brasil

Um homem britânico casado que mudou de sexo aos 58 anos ganhou na Justiça o direito de receber aposentadoria a partir dos 60 anos, idade mínima para as mulheres se aposentarem.

Christopher Timbrell, de 68 anos, mudou seu nome para Christine em 2000, após uma cirurgia para mudança de sexo.

A mudança foi feita com o consentimento da mulher, Joy, com quem Timbrell se casou há 42 anos e com quem tem dois filhos. Eles continuam vivendo juntos.

Mas o pedido de aposentadoria, feito dois anos após a cirurgia de troca de sexo, foi negado com base em uma lei que estabelece que os transexuais casados só têm a mudança de gênero reconhecida oficialmente se tiverem o casamento dissolvido ou anulado.

O Departamento de Trabalho e Pensões, do governo britânico, alegou que ela teria que esperar até os 65 anos, idade mínima para aposentadoria dos homens.

Discriminação

A advogada de Timbrell, Marie-Eleni Demetriou, argumentou que a obrigatoriedade de que ela terminasse seu casamento era uma violação aos seus direitos humanos.

O juiz que analisou o caso disse que a lei britânica não é capaz de lidar de maneira adequada com casos como o de Timbrell, estabelecendo que as pessoas que são “uma vez homens, são sempre homens”.

Segundo o juiz, a incapacidade da lei de lidar com pessoas que mudam de sexo representa uma discriminação, e por isso o Estado não teria o direito de negar a Timbrell o pedido de aposentadoria aos 60.

Ela terá agora direito aos pagamentos retroativos relativos aos últimos oito anos.

quarta-feira, 23 de junho de 2010

Seminário Temas do Direito Previdenciário

Seminário Temas do Direito Previdenciário
Dias 29 e 30 de junho e 01 de julho de 2010 - via Internet

Estão abertas as inscrições para o seminário Temas do Direito Previdenciário, que estará sendo realizado nos dias 29 e 30 de junho e 01 de julho próximos. O seminário contará com a apresentação de trabalhos de juristas do Brasil e do exterior. Certificados serão de provavelmente de 15 horas. Interessados em enviar trabalhos devem fazê-lo até o dia 24/06 ao e-mail: diretoria@ambito-juridico.com.br.

Como fazer a inscrição

As inscrições estarão abertas até quarta-feira, dia 30/06.
Se você quer fazer o Seminário Âmbito Jurídico Temas do Direito Previdenciário, e não sabe como se inscrever, siga as instruções abaixo:

1. Acesse o Âmbito Jurídico, em http://www.ambito-juridico.com.br e clique em login;
2... Coloque seu login (e-mail) e senha na área de identificação e tecle em entrar;
3. Clique em ensino e em seminários, e você será direcionado a página dos seminários, em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=seminarios;
4. Nesta página, clique sobre o título do seminário que pretende se inscrever, e logo em seguida em inscrever-se agora;
5. Você será direcionado a página de pagamento e inscrição. Leia atentamente a página e clique na forma de pagamento que deseja realizar. Abrirá uma nova página no site do PagSeguro (da UOL).. Verifique os dados que ali constam e se tudo estiver ok, clique em continuar, selecione a forma de pagamento, informe os dados do pagamento e clique em continuar.
6. Sua inscrição será recebida e tão-logo tenham sido verificados os dados, será validada.
- Caso queira efetuar o pagamento na modalidade depósito bancário, faça o depósito e informe os dados do pagamento (n. do documento, agência e a data em que fez o depósito, e o seminário em que está se inscrevendo) através do formulário de contato da página.

Se você esqueceu sua senha ou tem qualquer dúvida entre em contato conosco pelo formulário de contato da página ou clique aqui (http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=contato) .


Programa científico
Estará publicado até o dia 24/06 na página do seminário, em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index...php?n_link=seminarios_artigos&id_s=81

ASSÉDIO SEXUAL

ASSEDIO SEXUAL - Segundo o dicionário Aurélio, Assédio Sexual significa “ Insistência importuna, junto de alguém, com perguntas, propostas, pretensões,
Etc. ¨.
ART. 216 – A CÓDIGO PENAL : Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função. (incluído pela Lei nº 10.224/2001).
Pena – Detenção de , 1 (um) a 2 (dois) anos.

CONCEITO - É a insistência inoportuna, de um chefe sobre um empregado, na qual aquele condiciona a presença deste na empresa à prestação de favores sexuais. É um constrangimento ilegal exercido no ambiente laboral, hierarquicamente de cima para baixo. Não há assédio sexual se for hierarquicamente de baixo para cima.

Devemos observar que a pessoa que assedia está hierarquicamente acima da pessoa que é assediada. Trata-se de um constrangimento ilegal porque há grave ameaça, e a finalidade tem que ser a obtenção de um favor sexual.

QUESTÕES QUANTO AO GENERO:

Desde sempre há uma grande carga cultural que destaca e distancia homens e mulheres. Foi sempre cultuado que a mulher nasceu para servir e acompanhar o homem que, deve cumprir o papel de defendê-la. Isso é passado e não verdadeiro, não passam de costume herdado pelas civilizações, sem nenhuma base científica, que permanecem até hoje entre nós, em pleno século XXI, embora muito já tenham feito para mudar essa imagem, há muito mais a se fazer para derrubar estes conceitos.
Desde o se ingresso no mercado de trabalho, a mulher vem sofrendo vários aspectos
de discriminação quanto ao gênero e, por fim, são as maiores vítimas do que a legislação denomina “Assédio Sexual”, é claro que há casos inversos, em que o homem se vê assediado por uma mulher, mas essa não é a regra e sim a exceção. Em qualquer hipótese,essa prática agora é crime, com legislação específica e penalidades previstas.

Este crime surgiu porque a Organização Internacional do Trabalho (OIT), ao perceber que as mulheres faltavam mais ao trabalho, recebiam mais licenças e se aposentavam mais cedo do que os homens descobriram-se a existência do assédio sexual dentro das empresas, o qual produzia três conseqüências, ambas causadoras de prejuízos para a empresa:
1 - Ambiente com "baixo astral" (as mulheres assediadas que não aceitavam o assédio trabalhavam com mau humor, e este contaminava os demais empregados).
2 - Redução de produtividade da empresa devido ao "baixo astral" e também devido ao fato de que a mulher, em função do assédio, começava a faltar mais (provocar mais licenças).
3 - Tudo isto afetava a imagem pública da empresa (Poder Judiciário, imprensa), que passava a vender menos.

SUJEITO PASSIVO E ATIVO
Os sujeitos ativo e passivo do delito poderão ser o homem ou a mulher, até porque na sociedade atual não há mais espaço para diferenciação comportamental entre os sexos, além do que o tipo traz o pronome indefinido "alguém", a confirmar induvidosamente esta afirmação (no pólo passivo), por não ser um crime comum, trata-se de um crime próprio exigindo-se uma condição especial para quem o pratica, sendo que somente poderá ser sujeito ativo quem esteja numa posição de superior hierárquico, dentro da estrutura da empresa, está num patamar ascendente, em relação ao sujeito passivo, ou quem esteja numa posição de ascendência:
Posição de superioridade hierárquica – É a posição no trabalho que diz respeito à relações trabalhistas.

Posição de ascendência – Esta expressão engloba o professor, quando das relações de ensino, pois o professor não é superior hierárquico do aluno, mas tem ascendência sobre ele.
Porém para que seja caracterizado o assédio sexual, é necessário que o professor condicione o ato ao bom desempenho do aluno nas suas avaliações.

O sujeito ativo tem que se prevalecer da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de:
1- EMPREGO – Relativo às empresas privadas como por exemplo: empregada doméstica com CTPS assinada.
2 - CARGO – Relativo ao setor público.
3 - FUNÇÃO – Relativo ao setor púbico.

Entendemos então que caso o assédio sexual foi praticado sobre uma faxineira diarista, o fato é atípico. Não existe o requisito final, pois neste caso não há relação de emprego.

O mesmo se dá se o sujeito ativo é um professor particular, observando que não há ascendência deste sobre quem ele assedia.

O projeto original previa mais duas situações, ambas vetadas pelo ex-presidente FHC:
1 - Prevalecendo-se de relações domésticas ou de hospitalidade (que englobaria a diarista, as pessoas que cedem uma vaga na casa, etc).
2 - Exercício de ministério (padres, etc).

ASSEDIO SEXUAL NO LOCAL DE TRABALHO

È necessário saber exatamente o que vem a ser o Assédio Sexual no Local de Trabalho para se evitar equívocos, pois consiste em cantadas explícitas ou insinuações constantes, de cunho sensual ou sexual, sem que a vítima as deseje. Ou seja: é “forçar a barra” para conseguir favores sexuais, sendo uma atitude clara ou sutil; falada ou apenas insinuada; escrita ou explicitada em gestos; pode vir em forma de coação, quando alguém promete promoção para a mulher, desde que ela ceda; ou, ainda, em forma de chantagem, quando há uma ameaça como arma.
Nada impede que dois colegas de trabalho se apaixonem, se casem e formem família.

CARACTERÍSTICAS

Cantar um colega de trabalho só pode ter duas respostas: um sim ou um não. Se você receber um “sim”, pode ir em frente que não há crime algum nisso. Mas se você recebe um “não” e passa a perseguir a colega, aí você estará cometendo Assédio Sexual, cuja principal característica é nunca ser recíproco, passando a ser uma violência moral para se alcançar favores sexuais.
Não existe Assédio Sexual apenas de homens contra mulheres, pode haver de mulheres contra homens, homens contra homens; e mulheres contra mulheres, porém, pesquisas mostram que, em 99% dos casos, o autor do crime é um homem e a vítima, uma mulher.
Para a tipificação do delito previsto em nosso Código Penal, entendemos ser necessário que o constrangimento feito pelo agente tenha como fito manter com a vítima ato sexual: conjunção carnal ou ato libidinoso diverso. Mais uma vez, louvemo-nos no mestre Hungria:
"Conjunção carnal é a cópula , o ajuntamento do órgão genital do homem com o da mulher, a intromissão do pênis na cavidade vaginal." "Ato libidinoso é todo aquele que se apresenta como desafogo (completo ou incompleto) à concupiscência", tais como o coito anal, a felação, a heteromasturbação, os contatos físicos voluptuosos, etc.
A lei não se refere a ministério, pelo que estão fora do âmbito de alcance da norma, por exemplo, os padres, as freiras e os pastores (sob pena de admitirmos interpretação mais elástica, incompatível com a exegese das normas penais incriminadoras.
BEM JURÍDICO PROTEGIDO – É um crime complexo; há vários bens jurídicos envolvidos:
1 - Liberdade sexual que é o direito de dispor livremente sobre o seu próprio corpo;
2 - Não ser discriminado nas relações de trabalho;
3 – Quanto à Honra, esta é subjetiva, pois cabe a cada um pensar sobre si mesmo.

EXEMPLOS DE ASSEDIOS SEXUAIS
Piadas, comentários, carícias ou pedidos de favores sexuais indesejados, intimidação, ameaças, represálias, recusa de promoção, demissão ou outras injustiças associadas a uma recusa de favores sexuais.

A CONSUMAÇÃO
Para a sua consumação bastará que o sujeito ativo constranja o outro, por qualquer meio, direta ou indiretamente, à prestação de favor de natureza sexual. O constrangimento "pode ser formulado diretamente, a viso aperto ou facie ad faciem, sob a ameaça explícita ou implícita de represálias (imediatas ou futuras), ou indiretamente, servindo-se o agente de interposta pessoa, ou de velada pressão, ou fazendo supor, com maliciosas ou falsas interpretações, ou capciosas sugestões, a legitimidade da exigência."19
É delito que se consuma, portanto, independentemente da vítima ter-se submetido à proposta: para a sua configuração basta o mero constrangimento e a finalidade espúria. Se a vantagem ou o favor for efetivamente prestado estamos em face de mero exaurimento do delito, salvo se por si só configurar-se outra infração penal, como estupro ou atentado violento ao pudor, quando estaremos, então, diante de um concurso de crimes.
ADMITE TENTATIVA
A tentativa, no entanto, é admissível, na hipótese, por exemplo, da interceptação de uma carta na qual constava a ameaça e o pedido de natureza sexual.
O ÔNUS PROBATÓRIO
A prova da alegação incumbirá a quem a fizer, ou seja, caberá ao acusador, seja o próprio ofendido/querelante, quando se tratar de ação penal de iniciativa privada, sem prejuízo da possibilidade de o próprio Juiz Criminal proceder a determinadas diligências visando à elucidação de pontos obscuros.
A esse respeito, confira-se os seguintes julgados pátrios:
"Nos crimes contra os costumes, a palavra da vítima assume relevante importância quando se demonstre tratar-se de pessoa honesta e cujas declarações se harmonizam com o restante da prova". (TJSP – Rev. – Rel. Weiss de Andrade – RJTJSP 41/373).
"Em tema de delitos sexuais é verdadeiro truísmo dizer que quem pode informar da autoria é quem sofreu a ação. São crimes que exigem isoladamente, o afastamento de qualquer testemunha, como condição mesma de sua realização, de sorte que negar crédito à ofendida quando aponta quem a atacou é dasarmar totalmente o braço repressor da sociedade". (TJSP – AP – Rel. Acácio Rebouças – RT 442/380).
"Os delitos de natureza sexual são, rotineiramente, praticados na clandestinidade, cercado o sujeito ativo de todas as cautelas e cuidado, presentes, tão-somente, os personagens participantes da cena chocante. Bem por isso que, na palavra da ofendida, de fundamental importância para a elucidação da ocorrência, é que se haverá de encontrar socorro para a evidenciação da verdade, ou não, da imputação. Se não desmentida, se não se revela ostensivamente mentirosa ou contrariada, o que cumpre é aceitá-la, sem dúvida. Pois, na verdade, não se compreende ponha-se a vítima a, inescrupulosamente, incriminar alguém, atribuindose- lhe falsa autoria, sem que razões se vislumbrem para tanto." (TJSP – AP – 2ª. C – Rel. Canguçu de Almeida – RT 718/389).
Referências:
Lei do Assédio Sexual 10.224/01;
Nelson Hungria;
Código Penal;

quinta-feira, 17 de junho de 2010

MODELO DE PETIÇÃO

Da lesão à imagem, intimidade e privacidade ao corpo do morto e direito da Dignidade do ser humano

A publicação de imagem chocantes e brutais, dá ensejo a indenização por danos morais à família atingida de forma reflexa, podendo pleitear em nome próprio, na defesa de respeito ao morto.

Texto enviado ao JurisWay em 16/6/2010.

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Excelentíssimo (a) Senhor(a) Doutor(a) Juiz (a) de Direito da ____Vara Cível da Comarca de ___________Estado do Pará.





















(nome do Autor da ação), brasileiro (a), casada, empresária, portadora da cédula de identidade, registrada sob o nº ____________, CPF nº ________________, residente e domiciliado na Rua _____________, nº _____, bairro ________, Cidade _______, CEP. ____________, no Estado do _______, por seus procuradores infra-afirmados, mandato anexo (doc.1), com escritório localizado à ______________, nº_____, Bairro _______ Cidade ________, CEP. __________, no Estado do ______, onde recebe intimações, vem à presença de V. Ex., propor a presente:



AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS



nos termos dos artigos 12, parágrafo único, cumulado com artigo 20, parágrafo único do Código Civil de 2002 cumulado com art. 5º, incisos V e X e art. 220, §1º, ambos da CF/88, em face de GAZETA CIPÓ, pessoa jurídica de direito privado, concessionária de serviço público, com sede em Belém, na Rua do Estado, nº 00000, Manchete, Cep 900.000.000, no Estado do Pará, inscrito no C.N.P.J. sob o nº 00000000000, e no Cadastro Estadual sob o nº 000000000000, neste ato representada pelo seu representante legal, constituído nos autos _____________, brasileiro, ___________, _________o, Carteira da OAB nº __________, RG Nº __________ SS___, C.P.F. nº ______________, residente e domiciliado na Rua ___________, nº _________, bairro Centro Cep ______________, Cidade _________ no Estado_____, pelos fatos e fundamentos a seguir expostos:



DAS PARTES



1.Da legitimidade ad causam

Conforme preceitua o art. 12 parágrafo único do Código Civil de 2002, in verbis:

“Art. 12: Pode-se exigir que cesse a ameaça ou lesão, a direito da personalidade, e declamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei

“parágrafo único: em se tratando de morto, terá legitimação para requerer a medida prevista neste artigo o cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente em linha reta ou colateral até o quarto grau” (grifo nosso).

Portanto, embora o direito da personalidade cesse com a morte da pessoa natural (mors omnia solvit), há que se ressaltar, com fundamento, de que se deve resguardar a dignidade do ser humano, bem como seus restos mortais que lhe representam, admitindo-se, desta forma a preservação do direito da personalidade do cadáver, tendo o legislador reservado tais direitos pos mortem, para que os familiares diretamente atingidos do morto, possam reclamar em juízo indenização pela violação ou lesão.

Há que se frisar, ainda que, o nosso Código Civil de 2002, trás no art. 20, parágrafo único, que em se tratando de morto ou de ausente, são partes legítimas para requer a proteção, no que diz respeito a divulgação de escritos, transmissão da palavra ou a publicação,a exposição ou a utilização de imagens de uma pessoa poderão ser proibidas, sem prejuízo de indenização, quando lhe atingirem a honra a boa fama ou a respeitabilidade ou se destinarem a fins comerciais.

Logo, não há qualquer obstáculo, na presente ação, em que pese os ascendentes do morto, requererem indenização por danos morais e materiais em nome próprio, pelo fato dos meios de comunicação terem exposto a imagem do filho morto, de forma a causar-lhes, violação aos direitos inerentes ao cadáver, bem como a eles próprios.

A doutrina denomina tais legitimados como sendo “Os lesados indiretos são os parentes do morto que estão legitimados para requerer a tutela jurídica dos seus direitos da personalidade (art. 12, p. único e art. 20, p. único, CC). Pois, apesar de não haver direito da personalidade do morto, existe tutela jurídica dos direitos da personalidade da pessoa morta. É uma tutela reconhecida ao cônjuge/companheiro, ou qualquer parente em linha reta, ou colateral até o quarto grau. Nesse caso, os parentes estarão em juízo pedindo em nome próprio, direito próprio, uma vez que foram lesados também (ainda que indiretamente). Trata-se, assim, de legitimidade ordinária, não restando caracterizada a substituição processual.Legitimidade dos parentes para propor ação por dano moral à imagem do "de cujus"

(Extraído de: Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes - 01 de Outubro de 2008).

A publicação de imagem chocantes e brutais, dá ensejo a indenização por danos morais à família atingida de forma reflexa, podendo pleitear em nome próprio, na defesa de respeito ao mortos. In verbis:

DANO MORAL. FOTOGRAFIA. Houve a publicação de uma fotografia em um semanário de circulação entre fiéis de uma denominação. Naquela, não constava identificação da ofendida (já falecida) ou mesmo qualquer ataque a sua pessoa no texto jornalístico, apenas houve a divulgação, por uma vez, de sua imagem retirada do contexto da publicação originária (ocorrida sete anos antes) e acompanhada de tarjas em seus olhos. Nesse contexto, vê-se que o ressarcimento do dano moral pleiteado pelos membros da família da ofendida (cônjuge e filhos) constitui direito pessoal não advindo de herança: trata-se de direito próprio, sendo certo que lhes remanesce legitimidade na defesa à imagem da falecida. (...). Quanto à indenização, há que se adequar o valor fixado a título de dano moral nas instâncias ordinárias aos patamares praticados neste Superior Tribunal, reduzindo-o para R$ 145.250,00, quantum a ser rateado entre os autores e suportado igualmente entre as rés. Precedentes citados: REsp 697.141-MG , DJ 29/5/2006; REsp 521.697-RJ , DJ 20/3/2006, e REsp 348.388-RJ , DJ 8/11/2004. REsp 913.131-BA , Rel. Min. Carlos Fernando Mathias (Juiz convocado do TRF da 1ª Região), julgado em 16/9/2008 (informativo n. 0368, Período: 15 a 19 de setembro de 2008, colhidas nas sessões de julgamento e elaboradas pela Assessoria das Comissões Permanentes de Ministros, não consistindo em repositórios oficiais da jurisprudência deste Tribunal).

Com efeito, há previsão legal quanto a legitimidade de familiares para pleitear, conforme artigo 12, parágrafo único cominado com artigo 20, parágrafo único do Código Civil 2202, que pode o cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente em linha reta, ou colateral até o quarto grau, bem como os ascendentes e descendentes, exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade do morto, e ainda reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.

Assim, todos os parentes podem promover a ação individualmente ou em litisconsórcio facultativo. (art. 46 CPC), sendo que na ação em tela houve ação individual, não tendo que se falar em rateio.

Ademais, em que pese o Código Civil não reconhecer direitos da personalidade à pessoa morta, devido a mesma terminar com a morte e todos os direitos a ela relacionados, a indenização pelo dano moral pode ser pleiteado pelos membros da família, posto que a publicação da fotografia de pessoa já falecida, ofende de forma reflexa os familiares, que têm direito de pleitear indenização de danos morais e materiais.

Em complemento, ainda sobre o art. 12 do novo CC, foi aprovado enunciado na III Jornada de Direito Civil, realizada em dezembro de 2004, pelo Conselho da Justiça Federal, no sentido que a primeira parte do referido artigo refere-se a aplicação de tutela específica., sendo que este mesmo artigo consagra os direitos do morto, em seu parágrafo único prevendo a legitimidade de ascendentes, descendentes, cônjuge e colaterais até quarto grau pleitearem indenização no caso de danos à personalidade de pessoa falecida. São os chamados lesados indiretos, que sofrem os danos reflexos (dano em ricochete).

Não se trata de legitimação concorrente, sendo certo que o parentesco mais próximo deve excluir o mais remoto, de acordo com as regras de direito sucessório. Mesmo não havendo previsão no dispositivo legal, estendemos a legitimidade também ao companheiro, assim como o cônjuge, já que o convivente é também herdeiro pelo novo Código Civil, conforme o seu art. 1.790.



2. Inexistência de Solidariedade



Considerando que a solidariedade não se presume, devendo que haja um contrato firmado entre as partes, hão há que se falar no caso em análise, posto que conforme preceitua o artigo 46 do CPC, em que pese o litisconsórcio ser facultativo, o pólo ativo, pode ser composto por aqueles atingidos por via reflexa, logo podem e não devem. Não se tratando, neste caso, de legitimação concorrente.









DOS FATOS



No mês de dezembro de 2009, a autora ao passar pela banca de jornal, pode contemplar um jovem que havia sido vítima de homicídio, tendo o jornal destacado em manchete que a morte teria ocorrido, em virtude de “acerto de contas”, fato que fez com a requerente readquirisse referido jornal, ao ficar chocada com a exposição do cadáver.

Com efeito, ao ler o nome da vítima, verificou que se tratava de seu único filho, o qual fora assassinado, tendo seu corpo exposto sem nenhum respeito.

Assim como não serem verídicos os fatos alí constante. Pois ao contrário do que noticiava o jornal, seu filho não era menor infrator, como ali se fez constar, nem tão pouco, era envolvido em coisa dessa natureza.

Ademais, a forma como a empresa jornalística, expôs a imagem do cadáver, morto de forma brutal e sangrenta, fez com que a requerente ficasse chocada, o que agravou seu quadro de hipertensão, a ponto de ter um taquicardíaco, devido a forma como seu filho fora tratado e exposto sua imagem, e a inverdade da alegação contra sua pessoa, não sendo um menor infrator, mas estudante, conforme documento juntado aos autos.



DO DIREITO



1. Da lesão à imagem, intimidade e privacidade ao corpo do morto e direito da Dignidade do ser humano



O autor Elimar Szaniawshhi, em seu livro Direitos da Personalidade e sua tutela, São Paulo; RT, 1993, p. 303, referenciado pelos autores Pablo Stolze e Pamplona Filho[1], diz que embora tenha-se que a personalidade jurídica termina com a morte da pessoa natural , logo razoável que todos os direitos inerentes a ela também deixariam de existir para com o cadáver, este assevera que com fundamento na idéia de proteção da dignidade do ser humano e a representação de seus restos mortais, tem-se admitido a proteção de tal direito através de seus parentes. Senão vejamos:

“Aos parentes do morto, tratando-se de um direito familiar, diferente do tratamento que se dá as partes separadas do próprio corpo, e possui conotações e natureza de direito de propriedade. O direito ao cadáver diz respeito ao próprio defunto, a sua imagem, a sua memória , pois em certas ocasiões pode ocorrer atentados contra a memória do morto”.

Neste mesmo sentido decidiu a 4ª Câmara Cível Isolada do TJ-PA, ao acolher agravo de instrumento interposto por entidades de direitos humanos, com base no voto da desembargadora Eliana Abufaiad estabelecendo multa de 5 (cinco) mil reais diários, quem descumprir a proibição de fazer publicar fotos e imagens de pessoas vítimas de acidentes ou mortes brutais, que impliquem em afronta ao princípio da dignidade da pessoa humana e ao direito aos mortos, evitando-se, com isso, a utilização de imagens chocantes e brutais, sem qualquer conteúdo jornalístico, mas tão somente de fins meramente comercial., in verbis:

“EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO CONSTITUCIONAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DIREITO DIFUSO. LIBERDADE DE IMPRENSA. LIMITES. EXPOSIÇÃO EM JORNAIS IMPRESSOS DE FOTOGRAFIAS E IMAGENS EM DESTAQUES DE PESSOAS VÍTIMAS DE ACIDENTES, ASSASSINADAS E DEMAIS MORTES BRUTAIS. VIOLAÇÃO DA INTIMIDADE, DA HONRA E DA IMAGEM. INFRINGÊNCIA À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. DESRESPEITO AOS MORTOS. COLISÃO ENTRE DIREITOS FUNDAMENTAIS. INTELIGÊNCIA DO ART. 5º, IV, V, IX, X, XII E XIV C/C O ART. 220, § 1º, DA CARTA MAGNA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. IMPOSIÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER. MULTA DIÁRIA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

I – Como direito constitucional que é, assim como qualquer outro, não se mostra absoluto o direito de liberdade de imprensa. Ele encontra suas fronteiras quando se depara com outro direito existente no ordenamento constitucional, mais precisamente quando está por adentrar no espaço reservado à intimidade e à dignidade da pessoa humana.

II – In casu, há aparente conflito de direitos fundamentais, quais sejam o de livre manifestação e o da inviolabilidade da esfera íntima (art. 5º, X do CF), quando, no foco, encontra-se a liberdade de imprensa. Se, por um lado, é garantido aos meios de comunicação noticiar acontecimentos e expressar opiniões, por outro, não podemos olvidar o direito dos cidadãos à inviolabilidade da intimidade, da honra e da imagem.

III – No exercício da liberdade de imprensa, mister a observância dos direitos elencados nos incisos IV, V, X, XIII e XIV do art. 5º da Constituição Federal. Dentre esses se encontra o direito à inviolabilidade da imagem, da honra e da intimidade.

IV – No caso, mostra-se evidente que, a pretexto da liberdade de imprensa exercida pelos veículos de comunicação das empresas agravadas, ocorre inquestionável violação ou achatamento do que se convencionou denominar de dignidade da pessoa humana, especialmente, ao se expor sem o menor cuidado corpos de pessoas mutiladas, assassinadas, linchadas, etc., inclusive, exibindo à opinião pública o sofrimento dos seus familiares.” (Agv. Inst.N° 20083011863-1 , Rel. Desa. ELIANA RITA DAHER ABUFAIAD)..

Extrai-se, que tais divulgações de imagens, expondo corpos mutilados e imagens chocantes, não trazem nenhum conteúdo informativo, mas tão somente formas de chamar a atenção e comercialização, o que não se coaduna com o que nossa Carta Magna apregoa e preserva como Dignidade da Pessoa Humana e do respeito aos mortos, devendo ser evitando a utilização como meio de auferir receita.

Ressalta-se, ainda que a referida empresa, através do seu veículo de comunicação, publicou desnecessariamente a imagens do morto, vítima de homicídio, de forma a expor cenas chocantes e brutais do assassinato, sem qualquer conteúdo jornalístico, mas tão somente obter lucro, banalizando o ser humano a ponto de tratá-lo como instrumento de aumento de venda de jornais, o que atenta de forma visível contra diversos princípios constitucionais, especialmente a dignidade da pessoa humana, assim como narrou fato que inverídico. Neste sentido o desembargador Fábio Maia Viani, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais[2], firmou entendimento em seu voto para condenar a Rádio Espacial, de Pará de Minas (MG), a indenização no valor de R$ 13.950 à família de Francélio Gomes Vaz, morto em 2007.:

“O motivo foi a publicação da matéria “Homem suspeito de furtar cabos elétricos em poste da Cemig morre ao levar um choque de quase oito mil volts", veiculada em site mantido pela rádio.

A notícia trazia uma fotografia do jovem com a genitália exposta. Além disso, tratava o rapaz como “desocupado”. A mãe da vítima entrou com ação por danos morais contra a rádio afirmando que houve abuso na exposição da imagem do filho.

Em primeira instância, a rádio foi absolvida com a alegação de que apenas exerceu o direito de informação. Entretanto, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais reverteu a decisão, condenando a emissora.

“A sociedade estaria bem informada sobre o acontecido sem que para isso fosse necessário ilustrar a notícia com a fotografia da vítima despida. Além de sofrer com a perda do filho, a autora sofreu angústia, tristeza e vergonha ao se deparar com fotografias constrangedoras do momento da morte de seu filho, devida, portanto, a reparação pelos danos morais causados pelo abuso do direito de transmitir a informação.” (grifamos).

Vale referir, que a imagem foi publicada não apenas no caderno policial, mas também na capa do referido jornal, tendo sido ampliada, de forma a causar nos leitores e até mesmo transeuntes, que passam pelas bancas de jornal choques, pela exposição do cadáver.

Neste diapasão, há diante da situação uma colisão entre dois princípios constitucionais: o da liberdade de expressão das empresas jornalísticas e o da dignidade da pessoa humana, o que em tal situação deve prevalecer a proteção aos direitos da pessoa humana, haja vista o direito de liberdade de imprensa não ser absoluto.

In casu, o conflito existente de direitos fundamentais, quais sejam o direito de manifestação e expressão de pensamento e direito de intimidade e da vida privada, devem ser aplicados de forma a não haver violação, sendo garantido aos meios de comunicação noticiar acontecimentos e expressar opiniões, sem contudo afrontar o direito dos cidadãos à inviolabilidade da intimidade, da honra e da imagem.

A nossa carta Magna, em seu § 1º do artigo 220, marcou o limite, delimitando, neste contexto os parâmetros para o exercício do direito de liberdade pensamento. Senão vejamos:

“Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição.

§ 1º Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV.” (grifamos).

Portanto, para o exercício da liberdade de imprensa, deve-se observar os direitos elencados nos incisos IV, V, X, XIII e XIV do art. 5º da Constituição Federal. Dentre os quais se encontra o direito à inviolabilidade da imagem, da honra e da intimidade (inciso X).

Nesta linha de raciocínio a Constituição deve ser interpretada como um todo lógica num conjunto harmônico, não podendo tal interpretação ser feita isoladamente, mas de forma a assegurar adequada e compatível.

A compatibilização se procede de forma a impedir excessos e arbítrios, posto que o direito à liberdade de imprensa, de informação jornalística se contrapõe ao direito à inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem, sendo que este último tem o condão de limitar o exercício do primeiro, sendo o caso concreto que definirá, dentre as peculiaridades, essa ou aquela garantia constitucional.

Valendo-se, neste caso do princípio da proporcionalidade, que em seu sentido estrito, nada mais é do que a comparação entre as manifestações jornalísticas veiculadas, sob a garantia do exercício regular de um direito e a intensidade das restrições aos direitos fundamentais da sociedade, que embora conflituosos, estão amparado por princípios de igual valor e importância hierárquica, devemos fazer uso da medida de ponderação, com o objetivo de alcançar, em seu favor do princípio, em absoluto, a dignidade humana.

O caso, em concreto, nos mostra que, a referida empres, com pretexto da liberdade de imprensa, utilizou os veículos de comunicação (jornais), de forma a violar o princípio maior e basilar da república federativa Brasileira, denominado dignidade da pessoa humana, ao expor sem o menor cuidado o corpo da vítima de homicídio, esfacelado, com imagens chocantes, inclusive, na capa do jornal com o close ampliado, a identificar as partes do corpo esquartejado, sem qualquer respeito a pessoa do morto e seus familiares.



2. Do Dano moral



Usando como parâmetros o princípio da dignidade da pessoa humana, assim como a responsabilidade objetiva para proteção de tal princípio colocando na posição de sujeito passivo os entes privados, principalmente quando existe significativa diferença tanto econômica, como social e de influência, como no caso em tela, pelos limites impostos à liberdade de informação jornalística contidos na Carta Magna (§ 1º do art. 220), bem como a ponderação dos valores entre a liberdade de imprensa, visando ao lucro, e o direito de proteção a imagem, honra e vida privada do autor, cidadão comum, de bom conceito.

Os direitos da personalidade são expressamente reconhecidos e tutelados pela Constituição Federal, senão vejamos: “

Art. 5º (...)

V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; (grifos nossos)

(...)

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; (grifos nossos)

Com efeito, o uso indevido ou não autorizado de tais direitos à imagem, ainda que não cause dano material, resultará em dano moral pelo simples fato da publicação ou revelação da imagem não autorizada. Neste sentido, dispõe o Código Civil, em seu artigo 20: “Salvo se autorizadas, ou se necessárias à administração da justiça ou à manutenção da ordem pública, a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, ou a publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento e sem prejuízo da indenização que couber, se lhe atingirem a honra, a boa fama ou a respeitabilidade, ou se destinarem a fins comerciais”.

Ainda sobre o assunto assevera o autor Sílvio Rodrigues que: ““O abuso de direito ocorre quando o agente, atuando dentre das prerrogativas que o ordenamento jurídico lhe concede, deixa de considerar a finalidade social do direito subjetivo e, ao utilizá-lo desconsideradamente, causa dano a outrem. Aquele que exorbita no exercício de seu direito, causando prejuízo a outrem, pratica ato ilícito, ficando obrigado a reparar. Ele não viola os limites objetivos da lei, mas, embora os obedeça. Desvia-se dos fins sociais a que esta se destina, do espírito que a norteia[3]

Desta forma, apresenta-se reprimível a conduta da empresa ré, ao usar-se do exercício regular do direito de informar, para fazer publicar, ao expor fotografias em closes de pessoas mortas, a pondo de deixar os familiares em estado de perplexidade, evidenciando inquestionável desrespeito ao princípio da dignidade da pessoa humana.

Neste sentido o egrégio STJ, tem reiteradamente decidido:

“RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - DANOS MORAIS - PUBLICAÇÃO DE MATÉRIA JORNALÍSTICA OFENSIVA À HONRA DE ADVOGADO - LIBERDADE DE INFORMAÇÃO E DE INFORMAÇÃO - DIREITOS RELATIVIZADOS PELA PROTEÇÃO À HONRA, À IMAGEM E À DIGNIDADE DOS INDIVÍDUOS - VERACIDADE DAS INFORMAÇÕES E EXISTÊNCIA DE DOLO NA CONDUTA DA EMPRESA JORNALÍSTICA - REEXAME DE PROVAS - IMPOSSIBILIDADE - APLICAÇÃO DO ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA/STJ - QUANTUM INDENIZATÓRIO - REVISÃO PELO STJ - POSSIBILIDADE - VALOR EXORBITANTE - EXISTÊNCIA, NA ESPÉCIE - RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.

I - A liberdade de informação e de manifestação do pensamento não constituem direitos absolutos, sendo relativizados quando colidirem com o direito à proteção da honra e da imagem dos indivíduos, bem como ofenderem o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.

II - A revisão do entendimento do Tribunal a quo acerca da não veracidade das informações publicadas e da existência de dolo na conduta da empresa jornalística, obviamente, demandaria revolvimento dessas provas, o que é inviável em sede de recurso especial, a teor do disposto na Súmula 07/STJ.

III - É certo que esta Corte Superior de Justiça pode rever o valor fixado a título de reparação por danos morais, quando se tratar de valor exorbitante ou ínfimo.

IV - Recurso especial parcialmente provido.” (REsp 783.139/ES, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, QUARTA TURMA, julgado em 11/12/2007, DJ 18/02/2008 p. 33) – grifei.

Outros precedentes da 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, decidiu, no sentido que os direitos do morto devem ser resguardados e merecem ser protegidos, no que diz respeito à sua imagem e honra, senão vejamos:

"CIVIL. DANOS MORAIS E MATERIAIS. DIREITO À IMAGEM E À HONRA DE PAI FALECIDO.

Os direitos da personalidade, de que o direito à imagem é um deles, guardam como principal característica a sua intransmissibilidade. Nem por isso, contudo, deixa de merecer proteção a imagem e a honra de quem falece, como se fossem coisas de ninguém, porque elas permanecem perenemente lembradas nas memórias, como bens imortais que se prolongam para muito além da vida, estando até acima desta, como sentenciou Ariosto. Daí porque não se pode subtrair dos filhos o direito de defender a imagem e a honra de seu falecido pai, pois eles, em linha de normalidade, são os que mais se desvanecem com a exaltação feita à sua memória, como são os que mais se abatem e se deprimem por qualquer agressão que lhe possa trazer mácula.

(...)

“Os ataques e ofensas à memória do morto são ofensas aos seus parentes próximos, causando-lhes sofrimento e revolta. Dessa forma, os parentes próximos de pessoas famosas falecidas passam a ter um direito próprio, distinto dos direitos de que era titular o de cujus, que os ligitima para, por direito próprio, pleitearem indenização em juízo. Tal é a espécie dos autos, porquanto as autoras pleiteiam indenização, por direito próprio, por danos materiais e morais que alegam ter sofrido pela publicação não autorizada da biografia do seu falecido pai.

O novo Código Civil, atento aos princípios constitucionais e a toda legislação esparsa em nosso ordenamento jurídico relativos a esta matéria, disciplina os direitos da personalidade em seus arts. 11/21. Em seu art. 11 estabelece, após ressalvar casos previstos em lei, a intransmissibilidade e a irrenunciabilidade dos direitos da personalidade. Prevê, todavia, no parágrafo único do art. 12, que qualquer ameaça ou lesão a esse direito gera perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei e, em se tratando de morto, como no caso presente, os herdeiros indicados e o cônjuge são legitimados para buscar o ressarcimento ou a indenização decorrente de lesão. (...) De forma ainda mais explícita, em seu art. 20 e seu parágrafo único o novo Código Civil prevê a prévia autorização para a divulgação de escritos, a transmissão da palavra, publicação, a exposição ou a utilização da imagem de uma pessoa, pena de render ensejo a indenização, ocorrendo lesão a honra e a boa forma ou respeitabilidade, ou se destinarem a fins comerciais. Destaca, em seu parágrafo único, que em se tratando de morto, o caso presente, são partes legítimas para requerer a proteção o cônjuge, os ascendentes ou os descendentes. (...) No julgamento do Recurso Especial nº 268.660-RJ, interposto contra acórdão de minha relatoria prolatado na Apelação Cível nº 8.250/97, a Quarta Turma do STJ, relator o Min. Cesar Asfor Rocha, assim se pronunciou sobre questão idêntica: 'Vê-se, assim, ser certo que os direitos da personalidade, de que o direito à imagem é um deles, guardam como principal característica a sua intransmissibilidade. Nem por isso, contudo, deixa de merecer proteção a imagem de que falece, como se fosse coisa de ninguém, porque ela permanece perenemente lembrada nas memórias, como bem imortal que se prolonga para muito além da vida, estando até acima dela, como sentenciou Ariosto. Daí porque não se pode subtrair da mãe o direito de defender a imagem da sua falecida filha, pois são os pais aqueles que, em linha de normalidade, mais se desvanecem com a exaltação feita à memória e à imagem do falecido filho, como são os que mais se abatem e se deprimem por qualquer gesto que possa lhes trazer máculas. Daí porque têm eles legitimidade ativa para postular reparação por ofensas morais feitas à imagem de seus filhos, o que digo apenas de passagem já que o dano moral não foi aqui reconhecido e nem está mais sendo questionado. Ora, se é assim com razão maior se dá quando se cuida de buscar indenização pela ocorrência de dano material, por veiculação indevida e desautorizada da imagem da filha falecida pois a mãe também postula por direito próprio na condição de sua sucessora. (Recurso Especial nº 521.697 – RJ.).



2.a. Do quantum Indenizatório



O quantum indenizatório deve ser calculado, de acordo com a capacidade econômica da empresa ré e o dano suportado pela autora, tanto moral .como os matérias, advindo da lesão a que sofrera, de forma que tal quantificação não seja irrisória, que não cause ao infrator qualquer sofrido, nem a ponto de causar sua penúria, mas que este d. juízo possa utilizar-se do princípio da proporcionalidade, bem como da razoabilidade, ao quantificar o dano, levando em consideração as conseqüências de ordem moral e íntima suportada pela autora, no que diz respeito a violação pela imprensa, ao utilizar-se do direito de liberdade de expressão, fez constar e veicular imagem, do corpo do morto, vítima de homicídio, exposto de forma cruenta e violenta, sem qualquer finalidade social e informativa, mas tão somente lucrativa, sem qualquer respeito aos mortos. Senão vejamos:

“RECURSO ESPECIAL - RESPONSABILIDADE CIVIL - DANO MORAL - DIREITO DE INFORMAÇÃO - ANIMUS NARRANDI - DIREITO À HONRA - DISCUSSÃO VEDADA NESTA SEARA - REEXAME DE PROVA - INADMISSIBILIDADE - SÚMULA 07/STJ - DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL - QUANTUM INDENIZATÓRIO - POSSIBILIDADE DE REVISÃO PELO STJ - VALOR QUE EXTRAPOLA OS LIMITES DO RAZOÁVEL - INEXISTÊNCIA - MANUTENÇÃO DO MONTANTE FIXADO PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS - RECURSO NÃO CONHECIDO.

1. A responsabilidade civil decorrente de abusos perpetrados por meio da imprensa abrange a colisão de dois direitos fundamentais: a liberdade de informação e a tutela dos direitos da personalidade (honra, imagem e vida privada). A atividade jornalística deve ser livre para informar a sociedade acerca de fatos cotidianos de interesse público, em observância ao princípio constitucional do Estado Democrático de Direito; contudo, o direito de informação não é absoluto, vedando-se a divulgação de notícias falaciosas, que exponham indevidamente a intimidade ou acarretem danos à honra e à imagem dos indivíduos, em ofensa ao fundamento constitucional da dignidade da pessoa humana.

2. No que pertine à responsabilidade pelo dano cometido através da imprensa, o Tribunal a quo, ao apreciar as circunstâncias fático-probatórias, entendeu pela caracterização do dano moral, assentando que o recorrente abusou do direito de transmitir informações através da imprensa. Maiores digressões sobre o tema implicariam o reexame da matéria probatória, medida absolutamente vedada na via estreita do recurso especial, a teor da Súmula 07 desta Corte. Precedentes.

3. No que se refere à reparação por danos morais, tem-se que o valor arbitrado judicialmente não escapa ao controle do STJ, conforme remansosa jurisprudência desta Corte. Precedentes.

4. A lesão a direitos de natureza moral merece ser rechaçada mediante a fixação de indenização que repare efetivamente o dano sofrido, notadamente quando se trate de autoridade pública ocupante de cargo relevante na estrutura do Poder Judiciário Estadual, de modo que o patamar mantido pelo Tribunal a quo merece ser prestigiado. Precedentes.

5. Recurso especial não conhecido.” (REsp 818.764/ES, Rel. Ministro JORGE SCARTEZZINI, QUARTA TURMA, julgado em 15/02/2007, DJ 12/03/2007 p. 250).

Ante o exposto, acolho o parecer da Procuradoria de Justiça (fls. 230-243), para conhecer do presente agravo de instrumento e dar-lhe parcial provimento, para deferir o pedido recursal, objetivando impor às empresas agravadas a seguinte obrigação de não fazer: proibição imediata da utilização, nos jornais de suas responsabilidades, de fotos/imagens de pessoas vítimas de acidentes e/ou mortes brutais e demais imagens que não se coadunem com a preservação da dignidade da pessoa humana e do respeito aos mortos, evitando-se, com isso, a utilização de imagens chocantes e brutais, sem qualquer conteúdo jornalístico, mas com intuito meramente comercial.



Em que pese a lesão aos direitos da personalidade (artigos 11 a 21 do Código Civil), o dano moral deve ser como meio de atenuação do sofrimento daquele que o experimentou e não um preço, o que torna sua quantificação complexa, requerendo a aplicação do princípio da satisfação compensatória, bem como do princípio da proporcionalidade.

Embora, o Código Civil, tenha previsto a reparação do dano moral, este não estabeleceu critérios fixos para sua quantificação, ficando a cargo do magistrado arbitrá-lo. Que poderá com base na gravidade do dano e na situação econômica do ofensor arbitrá-lo, considerando o porte da empresa ré, poderá o juízo arbitrar no máximo possível, de forma a inibir atos dessa natureza, vez que tramita Ação Civil Pública, neste sentido.

DANO MORAL. Indenização - Recurso especial - Quantum fixado que se sujeita ao controle do STJ - Valor que não pode contrariar a lei ou o bom senso, mostrando-se manifestamente exagerado ou irrisório Ementa oficial: O valor da indenização por dano moral sujeita-se ao controle do STJ, desde que o quantum contrarie a lei ou o bom senso, mostrando-se manifestamente exagerado, ou irrisório, distanciando-se das finalidades da lei. Na espécie, levando em consideração a situação econômico-social das partes, a atividade ilícita exercida pelo réu segundo recorrente, de ganho fácil, o abalo físico, psíquico e social sofrido pelo autor, o elevado grau da agressão, a ausência de motivo e a natureza punitiva e inibidora que a indenização, no caso, deve ter, mostrou-se insuficiente o valor fixado pelo Tribunal de origem a título de danos morais, a reclamar majoração. (STJ - 4ª T.; REsp nº 183.508-RJ; Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira; j. 5/2/2002; v.u.) RT 814/167.

Precedentes

DANO MORAL. Ação indenizatória - Valor da causa - Autor que faz a indicação de quantia determinada na inicial - Admissibilidade - Fixação definitiva do quantum da verba que cabe ao juiz quando da prolação da sentença Nada obsta que, em ação indenizatória por danos morais, o autor indique na petição inicial quantia determinada como valor da causa, ainda que esta não tenha conteúdo econômico imediato, pois a quantificação definitiva cabe ao juiz por ocasião da sentença. (1º Tacivil - 6ª Câm.; AP nº 1.162.649-6-SP; Rel. Juiz Coutinho de Arruda; j. 1º/4/2003; v.u.) RT 814/250.

No mesmo sentido:

INDENIZAÇÃO Dano moral - Arbitramento que deve ser realizado com moderação - Hipótese em que o quantum deve ser proporcional ao grau de culpa, ao nível socioeconômico e ao porte da empresa recorrida - Necessidade de o magistrado se orientar pelos critérios de razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso. Ementa oficial: Na fixação da indenização por danos morais, recomendável que o arbitramento seja feito com moderação, proporcionalidade ao grau de culpa, ao nível socioeconômico dos autores, e, ainda, ao porte da empresa recorrida, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso[4]

Logo, o juiz deve arbitrar um valor, que corresponda à reprovabilidade da conduta ilícita, verificando o sofrimento da vítima, bem como a situação econômica do ofensor, dentre outros elementos determinantes para uma decisão que traga segurança jurídica.



3. Do Dano Material



Considerando que os pais do morto, vítima de homicídio, principalmente sua mãe, ao ver a imagem do seu filho exposto de forma brutal, causando-lhe sérios e graves transtornos de ordem morais e psicológicos, posto que a forma como a empresa jornalística, usando da liberdade de imprensa veiculou a notícia, assim como estampou a imagem de seu filho, causou a família, principalmente a mãe, que possui um quadro de depressão, sendo hipertensa e cardíaca, que com a notícia sensacionalista, agravou-lhe, ainda mais o seu estado, passando a crônico, não conseguindo sequer dormir, ao lembrar da foto de seu filho.

Com efeito, a autora tem realizado tratamento com especialista, em consultas psiquiatra, remédios e acompanhamento médico, devido ao seu quadro que se elevou, em decorrência da conduta da empresa jornalística.

Considerando que o dano material ao contrário do moral deve ser demonstrado, o que se verifica dos documentos juntados aos autos, (doc. 02) tendo a autora arcado com todos os custos de consultas e remédios.

A consulta é realizada uma vez ao mês, com especialista em psiquiatria, no valor de R$-300,00 (trezentos reais) tendo sido realizadas aproximadamente 3 (três) consulta até o presente momento, mas acompanhamento semanal, no importe de R$-100,00 (cem reais), totalizando 4 (quatro) acompanhamento por mês, bem como remédios, conforme notas -fiscais anexa (doc. 03).

Ademais os danos materiais são aqueles que atingem diretamente o patrimônio das pessoas físicas ou jurídicas. Senão vejamos:

“Os danos materiais podem ser configurados por uma despesa que foi gerada por uma ação ou omissão indevida de terceiros, ou ainda, pelo que se deixou de auferir em razão de tal conduta, caracterizando a necessidade de reparação material dos chamados lucros cessantes.

Para a reparação do dano material mostra-se imprescindível demonstrar-se o nexo de causalidade entre a conduta indevida do terceiro e o efetivo prejuízo patrimonial que foi efetivamente suportado Assim, entre particulares, apurar-se-á se a conduta reprovável e indevida foi ou não culposa, excetuando-se os casos das relações de consumo, onde a responsabilidade é objetiva, ou seja, não se discute culpa, mas somente a ocorrência ou não do fato gerador do dano e, também, os danos causados pela atividade indevida do Estado, para os quais prevalecem as mesmas regras.Por sua natureza, evidentemente, a demonstração da extensão do dano material deve ser precisa também quanto ao valor da indenização pretendida, pois o que se visa através da ação judicial é a recomposição da efetiva situação patrimonial que se tinha antes da ocorrência do dano (http://www.danos.com.br)

Vale, ainda referir que o dano material, é qualquer lesão causada aos interesses de outrem e que venha a lhe causar diminuição em seu patrimônio.

O autor AGUIAR DIAS, trata da matéria, em seu livro da Responsabilidade Civil, 7ª edição, editora Forense, Volume II, p. 798, o qual ensina que "A idéia do interesse (id quod interest) atende, no sistema de indenização, à noção de patrimônio como unidade de valor. O dano se estabelece mediante o confronto entre o patrimônio realmente que existe após o dano e o que possivelmente existiria, se o dano não tivesse sido produzido: o dano é expresso pela diferença negativa encontrada nessa operação”

Portanto os danos suportados podem gerar consequências de diferentes naturezas, haja vista a possibilidade dos danos materiais ou à imagem trazer consigo prejuízos que geram ainda dano moral, bem como um dano moral gerar lesões de ordem material ou à imagem.

Tal inviolabilidade à imagem e a privacidade foram expressamente consagrados na Constituição Brasileira de 1988, em seu art. 5º, inciso X: “São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;"









DOS PEDIDOS



Diante de todos os fatos e fundamentos anteriormente dispostos, REQUER:

1. Que se julgue procedente a presente ação de Reparação, condenando-se a empresa ao pagamento de verba indenizatória estipulada em R$ 20.000,00 (vinte mil reais), referente aos danos materiais, calculados em R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), conforme demonstra a memória de cálculo anexa e notas fiscais, e aos danos morais, estimados em R$ (17.500,00 (dezessete mil e quinhentos reais);

2. Os Benefícios da Assistência Judiciária Gratuita, de acordo com a Lei 1.060/50, em seu art. 4º, por não poder arcar com as custas processuais sem prejuízo da própria subsistência;

3. A citação da REQUERIDA na pessoa de seu procurador legal, conforme indicado no preâmbulo, no endereço ali constante, para que querendo e podendo, conteste a presente peça ação, sob pena de revelia e de confissão quanto à matéria de fato, de acordo com os arts. 285 e 319 do Código de Processo Civil;

4. Concessão de tutela antecipada, com fundamento no artigo 273, haja vista a existência de prova inequívoca e veracidade da alegação, pela publicação e circulação da imagem do morto, com a retirada de circulação do jornal, onde consta a imagem de João do Patrocínio Silva, assim como os excedentes que ficam sob a guarda da empresa jornalística, em decorrência da não vendagem, e retirada, ainda dos site, por sua publicação digital.

Requer, ainda, com fulcro no artigo 461 do CPC, a título de tutela, a obrigação de fazer consistente em publicação nota de desagravo, para informar e desculpar a família do morto, que teve seu direito violado, no afã de fins comerciais, com a veiculação nos jornais em finais de semana, durante 06 (seis) meses.

5. Seja condenada a REQUERIDA a pagar as custas processuais e os honorários advocatícios.

Pretende provar o alegado, mediante prova documental, testemunhal, realização de perícia técnica, e demais meios de prova em Direito admitidos, nos termos do art. 332 do Código de Processo Civil.

Dá-se o valor da causa em R$-25.000,00 (vinte cinco mil reais).

Termos que

Pede deferimento.

Belém 22 de março de 2010.



Estagiários do Núcleo de Prática Jurídica:



Antonia Lisânia Marques



Cristiane Pimentel

[1] GAGLIANO, Pablo Stolze e PAMPLONA FILHO, Rodolfo, Novo curso de Direito Civil, parte geral, Vol. I Ed. Saraiva, 8ª edição, p. 162.

[2] (http://www.comuniquese.com.br/conteudo)



[3] RODRIGUES, Silvio –Curso de direito civil, Ed. saraiva

[4] (http://www.professoramorim.com.br/amorim/texto.)



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